Eu fui percebendo sua cor voltando aos poucos. A marca do galo na testa não o deixava nem um pouco menos atraente. Pensei em afrouxar um pouco as cordas que fixavam seus braços à cabeceira da cama. Mas preferi esperar que ele recobrasse toda consciência e reclamasse que estava apertado demais. Percebi que ele se movia, mas começava a ter noção de que algo bloqueava seus movimentos, barrava sua vontade de se espreguiçar. Abriu um olho, depois o outro, e vi que ele havia recuperado totalmente a consciência. Não só isso, percebi o choque em seus olhos, ao se dar conta do que estava acontecendo. Li a surpresa transformando-se em raiva, e depois em submissão. Imagino quais seriam suas primeiras palavras, supondo que ele não estivesse amordaçado. Será que lhe faltaria criatividade e ele perguntaria o esperado oh, onde estou? ou o que está acontecendo? Não. Ele não tem nada de óbvio. Todas as expectativas se desfazem em pó.
Eu sorrio, da forma mais doce que eu consigo, e falo com uma voz firme e suave.
“Oi, Augusto.”
Ao me olhar, seu corpo treme se debatendo na tentativa de se soltar dali.
“Calma. Não faça assim. Vai se machucar.”
Mas apenas eu parecia estar preocupado com seu bem-estar. Ele não parecia entender. Seus pulsos ficavam avermelhados, só que em vão. As cordas estavam bem amarradas, não iam ceder. Disse-lhe para ter cuidado com as cordas, mas ele não me ouvia. Me senti angustiado ao vê-lo daquela forma e não sabia mais o que deveria dizer para acalmá-lo. Deitei-me sobre ele na cama e, aos poucos, ele finalmente se rendeu. Com o meu rosto muito próximo de seu ouvido, sentindo o cheiro doce de seu perfume, dizia que assim era bem melhor e que eu apenas queria o seu bem. Eu dizia, sobretudo, o quanto eu queria o seu bem. Naquele momento, seu olhar assustado se fixou no teto e notei uma lágrima rolando vagarosa. Meu coração começou a bater forte. Ele estava mais lindo do que nunca. Ali, tão frágil, aquela lágrima me comoveu de modo que me senti impelido a ajudá-lo. Com doçura, lambi o salgado da lágrima que escorria e disse “Por favor, não chora. Vai ficar tudo bem.”
De repente, aquela proximidade foi me afetando e fui sentindo meu pau intumescendo. Mas aquilo estava errado. Não tinha sido para isso que eu o havia trazido aqui, quase o arrastando, meio grogue por causa daquela merda que eu tinha colocado na bebida dele. Fui sentindo um calor, mas preferi me afastar dele. Ele já não se debatia mais, parecia haver desistido. Somente as lágrimas desciam copiosamente por suas bochechas. A surpresa havia dado lugar a uma espécie de conformidade silenciosa. Talvez ele estivesse pensando uma forma de sair dali. Sentei ao seu lado, e fui mexendo com umas mechas do seu cabelo. Meus dedos corriam por entre eles e eu tentava mostrar pra ele, sem falar mais, que eu estava ali apenas para protegê-lo. Tentei fazer com que a ternura falasse por mim. Mas ele afastou a cabeça o máximo que seus movimentos permitiam. E me olhou com raiva. Começou a gemer sons, primeiro timidamente, depois os gemidos foram se tornando mais nítidos. Ele tentava me dizer algo. Eu tentava decodificar os gemidos como se eles fossem código morse. “Eu te entendo”, ele dizia, “eu te entendo”. Não. Ele não estava entendendo nada. Talvez nem entendesse se eu pudesse começar a explicar que eu tinha sido obrigado a drogá-lo e amarrá-lo a uma cama, amordaçado, para proteger sua vida. Quem entenderia?
Peguei um lenço que estava na mesa de cabeceira, para secar suas lágrimas, quando algo que estava ali enrolado caiu ao meu pé. De súbito, meu coração começou a palpitar e, com a mesma rapidez com que olhei para o rosto dele, passaram por mim todas as possibilidades de fracasso de minha tarefa se, por um descuido desses, ele visse o objeto caído no chão. Estaria tudo acabado. Seria, de fato, o fim.
Ele continuava olhando para mim, cada movimento, mas sem se aperceber do que acontecia à nossa volta. Com calma, recolhi o que havia caído sem fazer qualquer movimento brusco e, finalmente, coloquei-o no meu bolso. Sorri aliviado. Não estava tudo acabado. Ainda.
Ao retornar para a cama, enxuguei as suas lágrimas com o lenço. Então, comecei a me lembrar da primeira vez que o vi, ao longe. Era uma tarde quente de verão, e a luminosidade do parque refletia uma curiosidade inocente e, ao mesmo tempo, quase pornográfica que me atraía como se a sua direção fosse o único caminho possível de ser tomado. Lembro de ter sonhado acordado com tudo aquilo que eu, um dia, faria se pudesse chegar assim tão perto dele. Mas o sonho já era coisa do passado. A inocência já havia escorrido pelo ralo da vida e o tempo se tornava valioso. Cada segundo. Então nada de carícias e promessas, nada de pedidos e cantadas. Era só... Apertei meu bolso sentido os contornos do que ele guardava. Falta muito pouco, querido, muito pouco, tentei sussurrar-lhe de leve, bem devagarzinho.
Como um relâmpago, retomei os nobres objetivos de minha missão que justificam todo esse sacrifício, todo esse pesar. Ele começou a se debater de novo, na esperança de se livrar das cordas. Não queria que ele se machucasse. Implorei aflitivamente que ele fosse prudente e confiasse em mim. Mas ele não entendia.
Ansioso, começo a ter desejos de não estar ali. Talvez se eu afrouxasse as cordas, eu conseguiria correr e correr. Será que ele me alcançaria? Seria que ele correria atrás de mim? Sorte que há para onde fugir nesse mundão enorme. Movimento-me na direção de seu rosto, resoluto a tirar dele a mordaça, mas a possibilidade de que ele queira estabelecer um diálogo é aterradora.
Meu relógio começou a apitar bip bip bip. Não sabia direito o que fazer nessa hora, que eu sabia que chegaria. Olhei para o relógio, calei-o apertando o botão lateral, tirei o que havia escondido no meu bolso e olhei para ele, que acompanhava vivamente todos os meus movimentos.
Estava na hora do ritual começar. Tirei da minha mochila meu celular e uma caixinha acústica. Achei a faixa que queria e coloquei pra tocar no modo repeat. A voz de uma mulher ia invadindo o ambiente e nada podia ser mais perfeito. You're unsure and...
...you're not ready so that must mean I want you / you're unavailable and disinterested and to you I look for comfort
Não, Alanis, ele não deveria saber. Ele não era um desconvidado. Ele me devia algo em troca.
A música foi me acalmando, foi me deixando num estado de êxtase. Finalmente, a hora havia chegado e eu não cabia mais em mim de tanta... alegria?
a million times in a million ways I will try to change you
a million months and a million days I'll try to convince you
Sinto minha face se enrubescer. Ele se debate na cama, a cada gesto meu ele parece entender menos o que está acontecendo. Eu afago seu cabelo, puxo o lóbulo da orelha. Agora não há mais nada pra esconder. Eu sei que vou conseguir te convencer, eu sei que a esperança é a última que morre. Ela resiste nos corações nobres. Ela vence sempre.
I have waited for you and adjusted for you and I'm done
I have deferred to you and enabled you and I'm done
E tudo que eu fiz, o melodrama que se materializou na minha vida, já que a sua continuava como um mar calmo, no seu próprio ritmo, um ritmo meio baiano, meio malandro, meio bolero, o melodrama seguia e tudo indicava que nada ia acabar como nos filmes de Hollywood. Parecia sim, que tudo ficava cutucando e reabrindo a ferida, e a fênix saia das cinzas que eu mesmo havia criado ao queimar meus sentimentos. Acabou, mas logo vinha a recaída. Foi sempre assim.
you're too young or you're too old or you're simply not inclined
you're asleep or you're withholding be that my cue to crave you
E eu colocava alguns objetos enfileirados ao lado da cama, enquanto acompanhava cantarolando a música e saboreava cada palavra como se fosse a primeira vez que eu prestasse atenção a elas, ou ainda, como se fosse a primeira vez que eu estivesse entendendo aquela língua estrangeira. Eu me convencia das nossas diferenças, de idade, de classe, de áreas de conhecimento, de espiritualidade. Será que você entendeu algum dia o que eu tava falando?
several times in several ways I'll try to squeeze love from you
several hours and several ways I'll feast on scraps thrown from you
Migalhas? Eu ria alto. Não sei se migalhas podem definir direito a percepção que eu tinha do que eu recebia de volta. Centro e periferia, dentro e fora, muito e pouco, relevante e irrelevante. Nada disso dava conta. Mas tudo disso já não tinha mais valor. Eu já não precisava mais apertar, não precisava mais pensar em formas de conseguir mais. Já não precisava mais fazer banquete em migalha nenhuma porque a minha fome agora era outra. Eu já não era mais predador, ainda que você parecesse presa, preso e amordaçado.
I have bent for you and I've deprived for you and I'm done
I have depressed for you and contorted for you and I'm done
I have stifled for you and compromised for you and I'm done
I have silenced for you and sacrificed for you and I'm done
Se eu fosse estabelecer uma comparação, assim inocente, entre o tempo em que estive triste, deprimido, que esperei e fiz sacrifícios, e o tempo de alegria em que a sua presença, mesmo que distante, me acalmava o peito, me secava as lágrimas, qual será que ganharia? Mas o tempo é só uma ilusão e você pressente isso. É tudo presente. As minha lembranças vão passando como bolas de fogo, na velocidade da luz, seu sorriso, seu jeito de olhar pra baixo quando não consegue sustentar os olhos que te perscrutam, vorazes. Quantas vezes eu me masturbava sentindo seu corpo, mas ele não era tão quente e brilhante quanto agora, quanto esse que se sacode e pulsa e me crispa e queima de longe. Escuto cada vaso sanguíneo como um rio, uma torrente. Me lembro de você gozando, mas esse você era o você que eu tinha inventado Eu gemo e encosto o ouvido no seu peito.
it won't be long before I am reclaimed
it won't take long and I'll be on path again
it won't be easy for us to disengage
I'm at the end of self deprivation stage
Mas as coisas mudam, não é? A mundo dá voltas, a fila anda, o rio não para de correr pro mar. Veja quanto clichê cabe em alguns segundos... E o inverno chega e cobre todos os vestígios do que uma hora foram apenas flores. Mas o inverno não é triste. Ele apenas é. Como eu. Como essa faca que tiro da mochila. Vejo seus olhos se encherem de terror, você sabe que eu vou fazer alguma besteira, não sabe? Sabe que eu não o amarraria à toa. Você sabe que o começo do fim está chegando. Lágrimas novamente pulam incontidas, seus pulsos vão se arroxeando, numa cor de vinho, que eu queria que fosse a cor dos seus olhos. Vejo você se debater inutilmente ao momento em que aproximo a faca do seu pescoço, o fio quase toca sua pele alva e o calor dos seus movimentos, ela dança e quase ganha vida, brigando com a minha mão que a segura respeitosamente. Num movimento rápido, largo ela como se estivesse queimando minha mão, em cima da mesa de cabeceira. Ainda não é agora que ela cumprirá o seu papel. Logo.
you're afraid of every woman afraid of your inner workings
you cringe at the thought of living under the same roof as me god and everything
Medo. Acho que ela tem toda a razão. Afinal, não é o medo que move as pessoas? Não é o medo que as leva a descobrir novas saídas? Será que o medo poderá me dar a resposta que eu sempre busquei e você nunca quis me dar? E ao meio dizer, meio pensar essas coisas, como se estivesse orando, murmurando sons meio vazios, decido partir para o desfecho. Denouement, diriam os franceses. Pego novamente a faca, que fica pesada na minha mão, gelada e impassiva. Pálida, até que seja trazida a vida. É nessa hora que eu sinto o cheiro do seu medo, sinto ele se tornando quase tangível ao me ver lustrando com a ponta da camiseta e me vendo no metal, ao ver através de mim, um mar de loucura vindo à tona e se materializando ali naquela faca. Vejo você se mexer como um animal que vai para o abate e sinto que é ridículo pedir que você se acalme, pois não consegue ver a lógica por trás de cada gesto, de cada pensamento se tornando ação.
Sei que a Alanis acertou em dizer que você não quer o mesmo texto, nem essas coisas de deus e tals, mas quase não me contenho na vontade de pedir que você reze, que você se arrependa e seja purificado. Passo a ponta da faca na sua pele, desenhando linhas e palavras e subo até que ela fica parada no seu pescoço, que, nesse momento, sua em bicas. Passo o fio lentamente pelo seu pescoço, marcando seu corpo com uma linha tênue, quase imperceptível, que metaforicamente, separa os limites da vida e da morte. Respiro fundo e olho pra dentro. Vejo que você quase desfalece. Nada. O lago continua tão límpido e calmo como num dia de primavera.
a million times and a million ways I've tried to alter to match you
several times every several days I've tried to uncrush on you
Mudar. Certamente muitas mudanças, mas nunca uma revolução de fato. Reformas íntimas que me afastavam de mim o tempo todo e só me trouxeram aqui, de volta ao mesmo banco, no mesmo por-do-sol, o mesmo mar calmo do fim da tarde, quando encostei minha cabeça no seu ombro e tudo fez sentido. Como se aquele fosse o meu destino. Certamente eu tentei te odiar, te substituir, te desconstruir e te ignorar. Uncrush. Mas percebo que o sentimento persiste, não como erva daninha, mas como Boscia albitrunca. Florescendo no Kalahari dos meus sentimentos, sonhos e medos.
A música termina e o silêncio paira, como um prêmio para sua alma cansada, confusa por toda essa festa de estímulos na qual eu te coloquei. E da qual você não pode mais me tirar. Ninguém pode. Enfio rápido minha mão no bolso e convido à luz um novo personagem. Seguro entre os dedos um vidrinho pequeno, transparente e aparentemente inofensivo. Sorrio e percebo que essa é a grande solução. Começo a chorar, e destampo o vidrinho com uma determinação que antes me parecia tão externa, mas que vinha das profundezas de mim, como um terremoto. Coloco na boca antes que qualquer pensamento possa opor ação à razão. Sinto o líquido me invadindo e descer queimando, lembrando-me da minha humanidade, da minha escolha. Doce sabor amargo de tudo que é e do que não foi. E essa cena me lembra da fala final de Romeu:
“Olhos, vede mais uma vez; é a última. Um abraço permiti-vos também, ó braços! Lábios, que sois a porta do hálito, com um beijo legítimo selai este contrato sempiterno com a morte exorbitante. Vem, condutor amargo! Vem, meu guia de gosto repugnante! Ó tu, piloto desesperado! lança de um só golpe contra a rocha escarpada teu barquinho tão cansado da viagem trabalhosa. Eis para meu amor. (Bebe.) Ó boticário veraz e honesto! tua droga é rápida. Deste modo...”
Sinto meus braços ficando pesados, e uma euforia boa vai me dominando, Enquanto sinto chegar no quarto um demônio de asas negras que vai tornando tudo uma penumbra e ri seu riso de escárnio e de vitória, antes que isso aconteça, como terminava a fala de Romeu? Ah, “desse modo, com um beijo, deixo a vida”. Isso. Removo sua mordaça, curvo-me, bent for myself, e antes que você possa se desviar ou reagir, beijo-lhe. Pego a faca, meio inebriado, assustado com o peso dela, e corto seus grilhões. Vejo você se sentar na cama e mesmo sem a mordaça você não produz uma palavra sequer. Mas leio nos seus olhos a compreensão do que era esse grande pesadelo, toda essa situação louca. Vou sendo ensurdecido pelo riso, que lembra o barulho do mar, com ondas bravas, mar de tempestade. Vou me sentindo leve por dentro. Livre afinal. Mas meu corpo vai caindo, fruto podre. Escuto você tentando combater o riso, gritando meu nome. Sinto, seus tapas na minha face, já meio anestesiadas, e tento sorrir, mas não sei se o sorriso se formou, ou apenas um contorcimento, uma careta primitiva. Sinto a escuridão me abraçando, em cada poro. E eu entendo, nesse exato segundo, que ela estava mentindo. Por que repetiria na música, tantas vezes, I am done, se não fosse pra se convencer, acima de tudo, se convencer de que aquilo era possível, de que não era apenas uma ilusão cujo véu cairia no passo seguinte? Não, querido/a, agora sim, I’m done.
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
quarta-feira, 30 de junho de 2010
A plateia
(escrito a 4 mãos com minha querida amiga Ace)
Quando paro minhas atividades, de repente, sinto vários sentimentos vindo juntos, como uma avalanche. Uma ansiedade, uma pontinha de medo, começo a enrolar mechas do meu cabelo com o indicador. Ah, se eu tivesse diante de um especialista em leitura corporal, será que ele saberia identificar todos os meus menores movimentos, a respiração rápida, a cócega nas mãos, a saliva descendo pela garganta? Meus olhos ardem. Só falta meia hora. Eu fico pensando que elas não vão vir. Quero desligar meu celular por medo que ele vibre e toque e anuncie que a festa acabou. Antes mesmo de ela começar. Tateio meu bolso e pego o celular. Haverá alguma ligação perdida? Faltam menos que 20 minutos. Será que elas vão se atrasar?
-Nossa, você já chegou?
Meu coração bate forte. Não esperava encontrá-lo aqui, assim, tão cedo. Há um minuto eu pensava que toda essa história era um blefe, uma cartada de um jogador ironizando a minha fragilidade. Eu não tenho coragem. Nunca tive. Sou uma cagona, até mesmo para admitir que sou. E estou aqui. Será que ele entende o quanto eu não tenho certeza de nada? O quanto me custa estar aqui nessa situação? Estou superando limites, estou voando mais alto, mas... será?
-Eu sempre chego cedo. Você deveria saber. Onde ela tá? Ainda não chegou?
Tremo quando vejo os dois na minha frente. Parada aqui, de longe olho para os dois, conversando. Quero correr, mas não sei direito em qual direção. Se eu fizer tudo depressa, talvez acabe mais rápido. Mas ainda posso fugir. Porém, caminho na direção deles. Penso que minhas pernas são duas amotinadas, me levando a um lugar em que eu não sei se, de fato, queria estar. Sinto borboletas no meu estômago, como diriam em inglês. E me aproximo cada vez mais. Ele está com aquele sorriso meio dissimulado de sempre. Ela é... ela parece... ela é linda. Ele tem sorte de que ela seja tão conivente. Altruísta? Eu não sei se conseguiria. Observar e não agir... E se eu visse algo que não me agrada? Mas ela parece uma pessoa sensata. Pelo menos foi o que ele me garantiu. Por que não?
- É. Chegamos todos. Tudo bem? Estamos tomando uma cerveja. Peço uma para você?
Com as duas assim, na minha frente, o mundo parece que parou. Não sei bem o que dizer, para onde olhar, como apresentá-las. Pensava em encontrar um lugar comum entre as conversas tão rotineiras que sempre tinha com uma e as tão casuais que mantinha com a outra. E não me vinha nenhuma. Não havia planejado como deveria agir e não me sinto exatamente do jeito que planejei. Meu corpo está anestesiado, vulnerável. Minhas mãos, por baixo da mesa, tremem. Mas meu sorriso se mantém inabalado. É ele a mola que propulsiona todo o resto. Meu celular toca, levo um susto e ele cai no chão. Nesse momento, o silêncio de alguns segundos eternos se quebra e as duas olham para mim. Pego o celular do chão, desligo-o e faço disso uma piada e um bom pretexto para uma conversa. Mas sinto meu rosto queimando.
Meus sentidos à flor da pele, como se cada som me tocasse, cada gesto vibrasse em mim o som grave de um violoncelo. Me falta a intimidade que há no diálogo entre eles dois. E eles nem falam! Só se olham, como se lessem os pensamentos um do outro. Sinto-me invadindo e sendo invadida. Fico calada e isso não combina comigo. Ao mesmo tempo, palavras afáveis começam a me abraçar (devo admitir o esforço que fazem para me incluir na conversa e, assim, me deixarem um pouco mais à vontade), mas nossos olhos brincam de desencontros e fugas, de uma ciranda de olhar-desviar. O incômodo se revela não ser só meu. Queria acabar logo com isso.
-Então, meninas? Podíamos ir, não? Ficaríamos mais à vontade.
Não via a hora. Não queria conversar. Ainda temo que alguma delas desista. Consentimentus fugit. Fazia tanto tempo que não a via, e, ainda assim, meus olhos parecem não ter perdido o costume, nem o caminho. Mas sinto que ela não está aqui por inteiro. Essa timidez repentina até que lhe caiu bem, mas não faz parte dela. Seu silêncio deixa claro que ela não está à vontade. Foi tão difícil convencê-la e, lembrar-me disso me traz a sensação de que, mesmo tendo-as aqui na minha frente, tudo ainda está por um fio. Fio esse que não quero que se quebre agora. Não agora. Não depois de tantas negociações, insistências. Não depois de tanto esforço.
-Vou com meu carro. Te sigo e nos encontramos lá.
Ele não pára de olhar para ela. Afinal, o que ela tem para deixá-lo assim? Não devia ter insistido. Não devia nem ter sugerido. Não devia ter aceito. Sinto um misto de ansiedade e arrependimento, de tesão e angústia. Será que consigo? Uma parte de mim bem que gostaria que ela desviasse o caminho, se perdesse ou simplesmente fosse embora. Mas, não! Já chegamos até aqui.
- Bom, chegamos. Me dá um beijo antes de entrarmos? Você sabe que é a mulher da minha vida, não sabe?
Sempre achei as entradas em motéis excitantes. Mas hoje é diferente. Nunca estive neste lugar tão sozinha e, ao mesmo tempo, tão acompanhada. Se não tive coragem de fugir quando ainda estava em tempo, me resigno, e sei que terei que ir até o fim. Abro a porta e entro. Olho ao redor. Meu corpo treme. Respiro fundo e ganho forças para recolocar minha máscara: vejo-os entrando pela porta, vou na direção dele e, na tentativa bem sucedida de fazê-la desaparecer, me concentro, finalmente, em desvendar com minha boca a textura e o sabor de sua pele. E gosto. Muito.
Não ouso abrir os olhos, mas percebo que nada se move, o corpo dele que antes havia se tensionado vai se soltando lentamente e agarrando minha cintura.
Ela o beija e ele ardentemente retribui a atitude. Vejo os corpos deles cedendo e se tocando e sinto que minha face está em chamas. Não consigo me mover. Mas quero. Sinto uma vontade louca de gritar, de terminar tudo, vejo sangue, minha respiração fica irregular. Será que vou desmaiar? Respiro fundo e consigo recuperar um pouco do ar. Parece que estou naquela posição, ali, aparada e indefesa por horas, mas deve ter sido apenas alguns segundos, pois o beijo continua, quente, barulhento. Retomo um pouco do meu autocontrole e dou um passo, tímido, depois mais um. Me afasto da porta e procuro algum lugar em que possa sentar. Penso em pegar meu celular e penso em, disfarçadamente, filmar aquilo para depois expô-los. Não. As coisas não podem funcionar desse jeito.
Fico lutando com meus sentidos. Tento ouvir tudo que acontece ao meu redor e saber o que ela faz, quero abrir os olhos e sentir o seu olhar. Porém, nada disso pode dar conta de me distrair do influxo de sensações que meu corpo vai me dando. Minhas mãos vão ganhando vida e vão percorrendo novas terras, desbravando curvas e me transformando num mestre do tatear. Eu aperto meus olhos e, na escuridão na qual eu mesmo me coloco, eu crio coragem e vou me entregando. Vou me esquecendo dos limites. Sinto que quase posso uivar. É animal, é primitivo, mas é calculado.
Sinto sua mão tocar meu corpo por debaixo do tecido, como se quisesse entrar na minha pele e, pelo tato, consumi-la. Meu corpo se aquece e arde. Lentamente, conduzo-o contra a cama e ele se rende, caindo subitamente sobre ela. Em resposta a um sorriso largo, enlaço-o com minhas pernas e sento sobre seu corpo. Desabotoo sem pressa cada botão de minha blusa, revelando lentamente a lingerie escolhida há dias. Sinto-me inteira, como se, ao despir-me, acrescentasse a mim a roupagem que me faltava. Levanto sua camisa e levemente toco sua pele com a minha: aprecio sua temperatura e sinto contra meu peito sua respiração rápida, ofegante. Tenho-o rendido aos meus caprichos e sigo beijando cada centímetro que separa, cada vez menos, minha boca do botão de sua calça. Ao chegar a meu destino, revelo sua nudez com as mãos, enquanto, mesmo fechando os olhos, vejo as curvas e volumes revelados através da brisa que crio ao expirar, e que volta contra minha face, como um sonar. Perco o controle sobre mim mesma, abro os olhos e acaricio seu pênis com minhas mãos e boca, provocando-o com meus movimentos e sentindo-me cada vez mais excitada.
Aqui, hipnotizado com seu delicioso veneno, sinto-a mover-se como uma serpente. Meus pensamentos colocam-me dentro e fora de meu corpo ao tentar imaginar o que vê e sente ela - sentada na cadeira, não perdendo nenhum movimento - enquanto outra está colada ao meu corpo. Mas um pensamento de repente me invade: não posso ficar aqui, imóvel! Levanto-me e surpreendo-a com toda minha gula em forma de despir, tirando sua roupa, peça por peça. Retomo um ritmo de corpos apertados, mãos traiçoeiras, rapidez, força, ação-reação. Sou eu, eu quem deve estar no controle e subjugar; eu comando.
Sentada aqui, tão perto e tão longe dele, experimento uma sensação completamente nova. Imaginei este momento por muitas outras vezes, mas, o que sinto agora, nunca tinha sentido antes. Mesmo sem conhecê-la, já a havia incluído em muitas de minhas fantasias, mas sempre com um pouco de mim naquela imagem. Não me vejo na imagem a minha frente e penso que fui traída pelo meu desejo. Sinto muita tensão, uma angústia. Olho para aqueles corpos e o tanto que eles agem de modo descontínuo, imprevisível. O quarto se aquece. Os gemidos, o som de seus corpos roçando os lençóis, as mãos que se entregam aos caprichos ora de um, ora de outro. E eu aqui: olhando. E olho, e olho... E vou me deixando levar. De repente, meu olhar se encontra com o dele. Queimo. Minha tensão vai se dissipando e começo a compreender meu lugar nesta cena: apesar dela, é minha presença que o excita. Seu olhar diz isso pra mim. Que sou eu quem está ali. Sempre. Aquilo que vejo, finalmente, se aproxima daquilo que desejei e meu corpo responde com um turbilhão de sensações, como se cada carícia trocada fosse sentida em mim. Meu corpo arde em fogo e geme, estremece, contrai-se. Mas o desconforto luta para se manter ali. O medo e a insegurança me fazem segurar firme nas bordas da cadeira. Quase já não sinto as pontas dos meus dedos. Quero gritar, sinto-me impelida a tirá-la dali. Não posso. Respiro fundo, e tento não deixar de respirar.
Sinto que ele finalmente despertou. Seus movimentos se tornam mais intensos, mais dirigidos. Meu empurrãozinho deu certo. Agora é impossível parar. Como um tornado, uma tempestade, sua boca vai sugando tudo, uma força incontrolável da natureza, vamos nos entregando, nos livrando das barreiras e dos pensamentos. Calor. Sede. Sinto suas mãos procurando, descendo pelas minhas costas num misto de carinho e violência e eu sinto minha pele cedendo à sua força. Sem sutiã, meus cabelos cobrem meu rosto, o que me faz fechar os olhos por alguns segundos, já pensando o quanto seria ruim abrir e ver o que estava acontecendo. Não, eu não conseguiria ver e ficar parada, não conseguiria observar sem me projetar, tento pensar nela, mas já não consigo mais controlar meus pensamentos. Apenas o prazer me dirige.
Me sinto livre. Jogo minha cueca num canto e a nudez não me assusta. Meu corpo é minha ferramenta, ele ressoa ao toque dos meus comandos, afinado. Sinto que estou todo molhado, o suor vai me deixando aderente, sinto as gotas correndo pela minha testa, pelas minhas têmporas, pelas minhas costas. Percebo que ela está um pouco assustada. Acho que ela não esperava que meu pinto fosse ser do jeito que é. Provavelmente ela esperava menos. Deve ter dado azar antes. Mas não sinto medo nela. Ela parece apenas surpresa, mas feliz. Sinto os dedos dela segurando meu pau e movendo pra frente e pra trás, de uma forma pouco ortodoxa. Mas sinto que ela segura com orgulho, aperta e solta, aperta e solta, sem parar os movimentos. Beijo seu pescoço, dando pequenas mordidas no lóbulo e gemendo na sua orelha. Beijo sua nuca e respiro profundamente, pesado. Procuro com minhas mãos afastar o elástico da sua calcinha, que teima em continuar ali. Sinto meus dedos dobrarem numa posição desconfortável e vou tateando com dois dedos, afastando, mas sinto que ela força uma coxa contra outra. Ainda não é a hora, eu penso.
Vejo o corpo dele nu e sinto seu cheiro invadindo minhas narinas. Ouço cada gemido que eles produzem como pequenas agulhas pelo meu corpo. Eu me pego quase sem respirar. Sinto minhas pernas amolecerem e mexo meus braços duros. Eles parecem pesar cem quilos cada. Percebo que quase estou presa nessa cadeira, como se a gravidade deixasse de existir, ou que ela me impedisse de qualquer movimento. Um olhar de relance no espelho sob a cama e percebo meu olhar de espanto, minha incredulidade de que aquilo esteja realmente acontecendo. Sinto as agulhas, mas elas vão deixando meu corpo quente. Deslizo minha mão direita pela minha coxa e sinto que estou molhada. Sinto uma vontade de ser tocada.
Abro os olhos e vejo-a lançando sobre mim um olhar que não consigo descrever, nem desvendar. O que estaria ela pensando agora? Não devia estar aqui, eu sabia que não deveria ter vindo. Mas o ardor intenso do prazer que se movimenta em mim me preenche. Meus músculos respondem aos mais variados estímulos com vigor e ardência. Sinto o peso do corpo dele sobre o meu, seu quadril pressionando seu pênis contra minha coxa, enquanto meus mamilos são estimulados pelo vai e vem de sua língua. Com as mãos, abaixo minha calcinha até onde meu braço alcança e ele a retira completamente, jogando-a em um canto qualquer. Estou nua. Ele beija minha coxa e virilha, e eu me rendo completamente. De olhos bem fechados, entrego-me ao prazer e ao desejo. A presença dela não causa mais incômodo.
Tê-la, assim, completamente nua em minhas mãos. Sentir seu cheiro, seu gosto. Inspiro profundamente na tentativa de guardar em mim esse momento, tudo que estou sentindo agora. Deslizo minhas mãos, meus lábios, minha língua pelo seu corpo e me coloco novamente sobre ela. Meu pênis toca suas coxas e ela as abre lentamente. Olho para o lado. Ela segue sentada na cadeira. Dou um sorriso e, por um segundo, penso que tudo aquilo não está acontecendo de verdade, que é tudo um sonho do qual vou acordar mais cedo ou mais tarde. Vejo-a sentada e olhando para nós de modo enigmático. O que estaria ela pensando? O prazer que projeto nela intensifica ainda mais aquilo que sinto. Meu pênis dança, procura caminhos. A hora é agora.
Ele me olha. Com a respiração cada vez mais profunda, vou me deixando levar pelo turbilhão de sentimentos que me invade e sinto como se toda minha energia estivesse canalizada, neste momento, em meu clitóris. Uma mão ainda segura firme a borda da cadeira enquanto a outra se mantém entre minhas pernas. E sinto como seria bom ser tocada agora. Bem assim...
Sinto ela toda úmida. Meu dedos mapeiam a região desconhecida como se nunca dantes. Desfecho um único golpe e a penetro de uma vez, sem avisos, sem dó. Vou sentindo meu pinto se enterrando nela, e forço pra que ele entre mais fundo. Sinto o corpo dela se arqueando sob meu peso e minha fúria. Eu não consigo conter um sorriso e suspiro no seu ouvido, quase como um gemido: calma! Sinto ela lutar comigo, mas vou dominando cada fibra do seu corpo, vou me fundindo, entrando na mesma sintonia. Ela vai arrefecendo. Ela se entrega. Eu vou fazendo leves movimentos, enquanto afundo meu rosto nos seus cabelos. Vou me colocando mais fundo, mas sem forçar demais. Já fui aceito e agora posso me movimentar com mais delicadeza. Sinto meu pinto abraçado por um calor, o vai-e-vem começa a chapinhar. Como ela está úmida! Seguro seus peitos e os beijo, mordendo levemente os mamilos. E olho para o lado, na cadeira, para ela. Seu olhar encontra o meu e eu enrijeço. Titubeio. Mas seu rosto marcado se desfaz em um sorriso de anuência. Como uma onda atingindo a praia. Vejo que sua calça está desabotoada e sua mão está dentro dela.
De onde estou, posso ver perfeitamente seus corpos diante de mim. Ao vê-lo penetrar-lhe, sinto a ardência como se todo aquele prazer invadisse meu corpo em uma explosão incontrolável. Não consigo me conter, como se minha mão não mais me pertencesse e transferisse a mim toda troca de carícias, toda imprevisibilidade, todo ardor da cena em frente a mim. Meu corpo se contorce, meus músculos vão se enrijecendo, e sinto o prazer angustiante que antecede o gozo. Que vem e me larga contra a cadeira, com os braços e pescoço amolecidos, a pálpebra fechada e um silêncio ensurdecedor que passa a ignorar todos os gemidos ao meu redor.
De repente, me sinto carne. Só carne. A violência no vai-e-vem inicial me paralisa, me contrai, me incomoda. Sinto-o entrar em mim como uma faca que rasga meu peito, furando minha alma, partindo-a ao meio e expelindo-a de mim. Só então me apercebo da guerra que se trava entre nossos corpos. E seu pedido de paz, sussurrando ao meu ouvido: "calma". Não quero calma! Quero devorar-lhe, sentir-lhe me invadindo e deixando, com isso, parte de si em mim. Quero, pelo movimento do meu quadril, sugar dele todo o prazer no deslizar daquele membro que me penetra e me queima. Daí, na medida em que o ritmo de nossos corpos se dissolve, luto para não me entregar completamente ao prazer. Esse maldito prazer que me liberta, mas me encarcera.
Pensamentossedissolvemcomoareiaaobateraondaeeujánãoconsigomaissaberondestou
tudosemesclanumaexplosãoquecomeçanaminhavirilhaejorraeesparamaparacadapartedomeucorpoe
aspalavrassedesfazemeosespaçosviramespasmos.
Eu. Dor. Sinto. Calor. Louca. Sangue corre. Voa. Ah. Uhn. Meu Deeeeeeeeuuuuuuus.
Ouvir os gemidos que viram gritos, meus dedos doem e as lágrimas descem uma a uma enquanto vou me sentindo como nunca antes, num prazer meu e deles. Ninguém me toca como eu e as lágrimas cessam enquanto eu arqueio e sinto meu corpo todo tremer e gritar de prazer.
Mal consigo me sustentar ainda. Espasmos retardados me fazem sentir em menor intensidade, mas ainda, o doce gosto da gozada que acabei de dar. Me sinto exausto, mas leve. Um zumbido no meu ouvido. Me largo na cama. Será que devo abraçá-la? Não ouso abrir meus olhos. Não ouço nenhum barulho e isso me assusta. Nem mesmo a respiração dela. Nada. É como se tudo tivesse se extinguido ao chegarmos ao ápice. Abro um olho. Ela está na cadeira, lívida. Será que está chorando? Nesse segundo sinto um movimento brusco do meu lado. Ela se levanta e se afasta. Não consigo ver seu rosto. Será que ela está sorrindo? Por que imagino um sorriso de escárnio ali? Ela se abaixa e pega suas roupas, procurando aqui e ali.
- Você quer beber alguma coisa?
Para falar a verdade, não quero. Mas respondo que sim, meio que sem pensar muito. Já estou imóvel há alguns minutos, catatônica, em um pensar sem-pensar que diz... Sinto meu corpo nu de uma nudez estranha, de uma pele crua, presente e translúcida. Como se tudo que eu sou estivesse sendo, neste momento, desvendado pelo olhar alheio. Cubro-me com o lençol.
-Eu também quero.
Desvio o olhar por um instante. E realmente quero, não necessariamente a bebida. Quero, por exemplo, entrar em cena, minha cena, minha vez. Me levanto e vou até o banheiro. Fecho a porta, observo minha imagem no espelho. Dou um sorriso maroto.
-Obrigada.
Sento, pego o copo na mão e o coloco ao lado, na cabeceira. A ausência dela ainda se faz presença, no vazio da cadeira, no ar, no pensar, no silêncio, no incômodo, na expectativa de que logo retornarão do banheiro: ela e seu olhar. Nua, invejo e cobiço, por um instante, o lugar do observador.
Vejo-me aqui, com ela ao meu lado, e minha cabeça gira. Tento recordar todos os movimentos e sensações há muito pouco vividos, como se não quisesse deixar escapar nada daquilo. Mais uma vez, o silêncio. Não sei exatamente o que dizer a ela. Ficamos uns instantes em silêncio. Penso em soltar uma piada, ou algum comentário qualquer, só para quebrar o incômodo silêncio. Mas nada me vem à cabeça. Somente eu e ela, e ela, ali, há pouco. Olho para seu rosto. Ela está distante, pensativa. Queria invadir seu pensamento, saber o que pensa. A insegurança me invade de novo. Penso em perguntar se aquele tom agudo de seus olhos deveriam significar alguma coisa para mim. Mas não encontro as palavras. Apenas olho. E olho. E olho... Ela, assim, tão nua, tão perto, tão distante, tão linda. Desejei-a com ardor e com mais ardor a tive. Mas não a tenho, de fato. Ela, neste momento, não me olha. Se arrependeu, talvez? Impossível! Ou seria possível? Sei lá. Nunca sei, ao certo, o que ela está realmente pensando. Gosto disso nela. Encosto, de leve, em seu cabelo. Ela olha para mim, sorri e fecha os olhos.
Por que será que ela não volta? O que será que ela está fazendo lá, sozinha, naquele banheiro? Lembrar-me dela me causa certa angústia. O que será que ela está pensando agora? Sinto-me, mais uma vez, vulnerável, refém. Deveria ir vê-la, talvez? O que está acontecendo?
- Já venho, ok?
Ele entra no banheiro e eu entro em mim. Olhando para mim mesma, por aquele espelho de teto, retomo meus objetivos ao ter aceito este convite e me sinto bem comigo mesma, agora que estou aqui, sozinha novamente. A apreensão do início foi embora; enfim, o fim. Ou seria o começo? Penso que logo abrirão aquela porta e sairão do banheiro, mas a expectativa dos olhares não me amedrontam mais. Eles não podem levar embora minha alma, meus pensamentos, minha satisfação. É. Estou inteira.
- Tudo bem? Posso entrar?
Entro no banheiro um pouco apreensivo. Vejo-a em frente ao espelho e agarro-a pela cintura. Ela olha para mim e sorri, e não é preciso dizer mais nada. Beijo-a longamente e sinto o conforto e o prazer de me aproximar, de novo, daquilo que é familiar a nós.
Com ele aqui, me sinto segura e completa. Meu corpo arde em desejo e colo meu corpo no dele como se quisesse fundi-los em um. Desejo, agora, mais do que nunca, tomar aqui o lugar dela, ser ela, mas sendo eu. Penso naquele banheiro como um oásis no deserto. Um pequeno espaço habitado por apenas dois, com água e sombra fresca, acalanto e intimidade, brisa e ardor. Ela, em pensamento, torna-se novamente presença, mas agora em ausência. Mas concordo com ele que é preciso sairmos dali. Me convenço de que valeu a pena, apesar das angústias vividas ali. Ele voltou a mim. Ele é meu. E isso me basta. Pego-o pela mão, abro a porta, um pouco receosa. Imagens daqueles corpos em ardência me invadem, e a tensão da insegurança se funde novamente com o tesão. Gosto dessa sensação e sigo os passos a diante.
Para minha surpresa, e alívio, ela não está mais ali.
- Enfim, sós.
- Enfim, nós.
Ele me abraça e eu me sinto protegida. Nosso abraço é longo e quente. Ainda pareço sentir o cheiro que não é dele ali, mas vou me fundindo ao seu corpo nu e sinto sua respiração nos meus cabelos. Sinto seu corpo se afastar do meu, ainda que ele mantenha os braços ao meu redor e sua cintura colada na minha. Ele me olha e abre um sorriso, a princípio tímido. Sua boca se aproxima da minha, como ela sempre costuma fazer, mas parece agora outra boca, parece que todos os nossos gestos de carinho ganharam um novo significado. Ele me beija ardentemente e eu volto a sentir pontadas e calores. Ela já não existe mais. Vou me largando na cama, enquanto seus braços fortes vão tirando a minha blusa. Ele é meu, mas ele é outro. Eu o amo.
Quando paro minhas atividades, de repente, sinto vários sentimentos vindo juntos, como uma avalanche. Uma ansiedade, uma pontinha de medo, começo a enrolar mechas do meu cabelo com o indicador. Ah, se eu tivesse diante de um especialista em leitura corporal, será que ele saberia identificar todos os meus menores movimentos, a respiração rápida, a cócega nas mãos, a saliva descendo pela garganta? Meus olhos ardem. Só falta meia hora. Eu fico pensando que elas não vão vir. Quero desligar meu celular por medo que ele vibre e toque e anuncie que a festa acabou. Antes mesmo de ela começar. Tateio meu bolso e pego o celular. Haverá alguma ligação perdida? Faltam menos que 20 minutos. Será que elas vão se atrasar?
-Nossa, você já chegou?
Meu coração bate forte. Não esperava encontrá-lo aqui, assim, tão cedo. Há um minuto eu pensava que toda essa história era um blefe, uma cartada de um jogador ironizando a minha fragilidade. Eu não tenho coragem. Nunca tive. Sou uma cagona, até mesmo para admitir que sou. E estou aqui. Será que ele entende o quanto eu não tenho certeza de nada? O quanto me custa estar aqui nessa situação? Estou superando limites, estou voando mais alto, mas... será?
-Eu sempre chego cedo. Você deveria saber. Onde ela tá? Ainda não chegou?
Tremo quando vejo os dois na minha frente. Parada aqui, de longe olho para os dois, conversando. Quero correr, mas não sei direito em qual direção. Se eu fizer tudo depressa, talvez acabe mais rápido. Mas ainda posso fugir. Porém, caminho na direção deles. Penso que minhas pernas são duas amotinadas, me levando a um lugar em que eu não sei se, de fato, queria estar. Sinto borboletas no meu estômago, como diriam em inglês. E me aproximo cada vez mais. Ele está com aquele sorriso meio dissimulado de sempre. Ela é... ela parece... ela é linda. Ele tem sorte de que ela seja tão conivente. Altruísta? Eu não sei se conseguiria. Observar e não agir... E se eu visse algo que não me agrada? Mas ela parece uma pessoa sensata. Pelo menos foi o que ele me garantiu. Por que não?
- É. Chegamos todos. Tudo bem? Estamos tomando uma cerveja. Peço uma para você?
Com as duas assim, na minha frente, o mundo parece que parou. Não sei bem o que dizer, para onde olhar, como apresentá-las. Pensava em encontrar um lugar comum entre as conversas tão rotineiras que sempre tinha com uma e as tão casuais que mantinha com a outra. E não me vinha nenhuma. Não havia planejado como deveria agir e não me sinto exatamente do jeito que planejei. Meu corpo está anestesiado, vulnerável. Minhas mãos, por baixo da mesa, tremem. Mas meu sorriso se mantém inabalado. É ele a mola que propulsiona todo o resto. Meu celular toca, levo um susto e ele cai no chão. Nesse momento, o silêncio de alguns segundos eternos se quebra e as duas olham para mim. Pego o celular do chão, desligo-o e faço disso uma piada e um bom pretexto para uma conversa. Mas sinto meu rosto queimando.
Meus sentidos à flor da pele, como se cada som me tocasse, cada gesto vibrasse em mim o som grave de um violoncelo. Me falta a intimidade que há no diálogo entre eles dois. E eles nem falam! Só se olham, como se lessem os pensamentos um do outro. Sinto-me invadindo e sendo invadida. Fico calada e isso não combina comigo. Ao mesmo tempo, palavras afáveis começam a me abraçar (devo admitir o esforço que fazem para me incluir na conversa e, assim, me deixarem um pouco mais à vontade), mas nossos olhos brincam de desencontros e fugas, de uma ciranda de olhar-desviar. O incômodo se revela não ser só meu. Queria acabar logo com isso.
-Então, meninas? Podíamos ir, não? Ficaríamos mais à vontade.
Não via a hora. Não queria conversar. Ainda temo que alguma delas desista. Consentimentus fugit. Fazia tanto tempo que não a via, e, ainda assim, meus olhos parecem não ter perdido o costume, nem o caminho. Mas sinto que ela não está aqui por inteiro. Essa timidez repentina até que lhe caiu bem, mas não faz parte dela. Seu silêncio deixa claro que ela não está à vontade. Foi tão difícil convencê-la e, lembrar-me disso me traz a sensação de que, mesmo tendo-as aqui na minha frente, tudo ainda está por um fio. Fio esse que não quero que se quebre agora. Não agora. Não depois de tantas negociações, insistências. Não depois de tanto esforço.
-Vou com meu carro. Te sigo e nos encontramos lá.
Ele não pára de olhar para ela. Afinal, o que ela tem para deixá-lo assim? Não devia ter insistido. Não devia nem ter sugerido. Não devia ter aceito. Sinto um misto de ansiedade e arrependimento, de tesão e angústia. Será que consigo? Uma parte de mim bem que gostaria que ela desviasse o caminho, se perdesse ou simplesmente fosse embora. Mas, não! Já chegamos até aqui.
- Bom, chegamos. Me dá um beijo antes de entrarmos? Você sabe que é a mulher da minha vida, não sabe?
Sempre achei as entradas em motéis excitantes. Mas hoje é diferente. Nunca estive neste lugar tão sozinha e, ao mesmo tempo, tão acompanhada. Se não tive coragem de fugir quando ainda estava em tempo, me resigno, e sei que terei que ir até o fim. Abro a porta e entro. Olho ao redor. Meu corpo treme. Respiro fundo e ganho forças para recolocar minha máscara: vejo-os entrando pela porta, vou na direção dele e, na tentativa bem sucedida de fazê-la desaparecer, me concentro, finalmente, em desvendar com minha boca a textura e o sabor de sua pele. E gosto. Muito.
Não ouso abrir os olhos, mas percebo que nada se move, o corpo dele que antes havia se tensionado vai se soltando lentamente e agarrando minha cintura.
Ela o beija e ele ardentemente retribui a atitude. Vejo os corpos deles cedendo e se tocando e sinto que minha face está em chamas. Não consigo me mover. Mas quero. Sinto uma vontade louca de gritar, de terminar tudo, vejo sangue, minha respiração fica irregular. Será que vou desmaiar? Respiro fundo e consigo recuperar um pouco do ar. Parece que estou naquela posição, ali, aparada e indefesa por horas, mas deve ter sido apenas alguns segundos, pois o beijo continua, quente, barulhento. Retomo um pouco do meu autocontrole e dou um passo, tímido, depois mais um. Me afasto da porta e procuro algum lugar em que possa sentar. Penso em pegar meu celular e penso em, disfarçadamente, filmar aquilo para depois expô-los. Não. As coisas não podem funcionar desse jeito.
Fico lutando com meus sentidos. Tento ouvir tudo que acontece ao meu redor e saber o que ela faz, quero abrir os olhos e sentir o seu olhar. Porém, nada disso pode dar conta de me distrair do influxo de sensações que meu corpo vai me dando. Minhas mãos vão ganhando vida e vão percorrendo novas terras, desbravando curvas e me transformando num mestre do tatear. Eu aperto meus olhos e, na escuridão na qual eu mesmo me coloco, eu crio coragem e vou me entregando. Vou me esquecendo dos limites. Sinto que quase posso uivar. É animal, é primitivo, mas é calculado.
Sinto sua mão tocar meu corpo por debaixo do tecido, como se quisesse entrar na minha pele e, pelo tato, consumi-la. Meu corpo se aquece e arde. Lentamente, conduzo-o contra a cama e ele se rende, caindo subitamente sobre ela. Em resposta a um sorriso largo, enlaço-o com minhas pernas e sento sobre seu corpo. Desabotoo sem pressa cada botão de minha blusa, revelando lentamente a lingerie escolhida há dias. Sinto-me inteira, como se, ao despir-me, acrescentasse a mim a roupagem que me faltava. Levanto sua camisa e levemente toco sua pele com a minha: aprecio sua temperatura e sinto contra meu peito sua respiração rápida, ofegante. Tenho-o rendido aos meus caprichos e sigo beijando cada centímetro que separa, cada vez menos, minha boca do botão de sua calça. Ao chegar a meu destino, revelo sua nudez com as mãos, enquanto, mesmo fechando os olhos, vejo as curvas e volumes revelados através da brisa que crio ao expirar, e que volta contra minha face, como um sonar. Perco o controle sobre mim mesma, abro os olhos e acaricio seu pênis com minhas mãos e boca, provocando-o com meus movimentos e sentindo-me cada vez mais excitada.
Aqui, hipnotizado com seu delicioso veneno, sinto-a mover-se como uma serpente. Meus pensamentos colocam-me dentro e fora de meu corpo ao tentar imaginar o que vê e sente ela - sentada na cadeira, não perdendo nenhum movimento - enquanto outra está colada ao meu corpo. Mas um pensamento de repente me invade: não posso ficar aqui, imóvel! Levanto-me e surpreendo-a com toda minha gula em forma de despir, tirando sua roupa, peça por peça. Retomo um ritmo de corpos apertados, mãos traiçoeiras, rapidez, força, ação-reação. Sou eu, eu quem deve estar no controle e subjugar; eu comando.
Sentada aqui, tão perto e tão longe dele, experimento uma sensação completamente nova. Imaginei este momento por muitas outras vezes, mas, o que sinto agora, nunca tinha sentido antes. Mesmo sem conhecê-la, já a havia incluído em muitas de minhas fantasias, mas sempre com um pouco de mim naquela imagem. Não me vejo na imagem a minha frente e penso que fui traída pelo meu desejo. Sinto muita tensão, uma angústia. Olho para aqueles corpos e o tanto que eles agem de modo descontínuo, imprevisível. O quarto se aquece. Os gemidos, o som de seus corpos roçando os lençóis, as mãos que se entregam aos caprichos ora de um, ora de outro. E eu aqui: olhando. E olho, e olho... E vou me deixando levar. De repente, meu olhar se encontra com o dele. Queimo. Minha tensão vai se dissipando e começo a compreender meu lugar nesta cena: apesar dela, é minha presença que o excita. Seu olhar diz isso pra mim. Que sou eu quem está ali. Sempre. Aquilo que vejo, finalmente, se aproxima daquilo que desejei e meu corpo responde com um turbilhão de sensações, como se cada carícia trocada fosse sentida em mim. Meu corpo arde em fogo e geme, estremece, contrai-se. Mas o desconforto luta para se manter ali. O medo e a insegurança me fazem segurar firme nas bordas da cadeira. Quase já não sinto as pontas dos meus dedos. Quero gritar, sinto-me impelida a tirá-la dali. Não posso. Respiro fundo, e tento não deixar de respirar.
Sinto que ele finalmente despertou. Seus movimentos se tornam mais intensos, mais dirigidos. Meu empurrãozinho deu certo. Agora é impossível parar. Como um tornado, uma tempestade, sua boca vai sugando tudo, uma força incontrolável da natureza, vamos nos entregando, nos livrando das barreiras e dos pensamentos. Calor. Sede. Sinto suas mãos procurando, descendo pelas minhas costas num misto de carinho e violência e eu sinto minha pele cedendo à sua força. Sem sutiã, meus cabelos cobrem meu rosto, o que me faz fechar os olhos por alguns segundos, já pensando o quanto seria ruim abrir e ver o que estava acontecendo. Não, eu não conseguiria ver e ficar parada, não conseguiria observar sem me projetar, tento pensar nela, mas já não consigo mais controlar meus pensamentos. Apenas o prazer me dirige.
Me sinto livre. Jogo minha cueca num canto e a nudez não me assusta. Meu corpo é minha ferramenta, ele ressoa ao toque dos meus comandos, afinado. Sinto que estou todo molhado, o suor vai me deixando aderente, sinto as gotas correndo pela minha testa, pelas minhas têmporas, pelas minhas costas. Percebo que ela está um pouco assustada. Acho que ela não esperava que meu pinto fosse ser do jeito que é. Provavelmente ela esperava menos. Deve ter dado azar antes. Mas não sinto medo nela. Ela parece apenas surpresa, mas feliz. Sinto os dedos dela segurando meu pau e movendo pra frente e pra trás, de uma forma pouco ortodoxa. Mas sinto que ela segura com orgulho, aperta e solta, aperta e solta, sem parar os movimentos. Beijo seu pescoço, dando pequenas mordidas no lóbulo e gemendo na sua orelha. Beijo sua nuca e respiro profundamente, pesado. Procuro com minhas mãos afastar o elástico da sua calcinha, que teima em continuar ali. Sinto meus dedos dobrarem numa posição desconfortável e vou tateando com dois dedos, afastando, mas sinto que ela força uma coxa contra outra. Ainda não é a hora, eu penso.
Vejo o corpo dele nu e sinto seu cheiro invadindo minhas narinas. Ouço cada gemido que eles produzem como pequenas agulhas pelo meu corpo. Eu me pego quase sem respirar. Sinto minhas pernas amolecerem e mexo meus braços duros. Eles parecem pesar cem quilos cada. Percebo que quase estou presa nessa cadeira, como se a gravidade deixasse de existir, ou que ela me impedisse de qualquer movimento. Um olhar de relance no espelho sob a cama e percebo meu olhar de espanto, minha incredulidade de que aquilo esteja realmente acontecendo. Sinto as agulhas, mas elas vão deixando meu corpo quente. Deslizo minha mão direita pela minha coxa e sinto que estou molhada. Sinto uma vontade de ser tocada.
Abro os olhos e vejo-a lançando sobre mim um olhar que não consigo descrever, nem desvendar. O que estaria ela pensando agora? Não devia estar aqui, eu sabia que não deveria ter vindo. Mas o ardor intenso do prazer que se movimenta em mim me preenche. Meus músculos respondem aos mais variados estímulos com vigor e ardência. Sinto o peso do corpo dele sobre o meu, seu quadril pressionando seu pênis contra minha coxa, enquanto meus mamilos são estimulados pelo vai e vem de sua língua. Com as mãos, abaixo minha calcinha até onde meu braço alcança e ele a retira completamente, jogando-a em um canto qualquer. Estou nua. Ele beija minha coxa e virilha, e eu me rendo completamente. De olhos bem fechados, entrego-me ao prazer e ao desejo. A presença dela não causa mais incômodo.
Tê-la, assim, completamente nua em minhas mãos. Sentir seu cheiro, seu gosto. Inspiro profundamente na tentativa de guardar em mim esse momento, tudo que estou sentindo agora. Deslizo minhas mãos, meus lábios, minha língua pelo seu corpo e me coloco novamente sobre ela. Meu pênis toca suas coxas e ela as abre lentamente. Olho para o lado. Ela segue sentada na cadeira. Dou um sorriso e, por um segundo, penso que tudo aquilo não está acontecendo de verdade, que é tudo um sonho do qual vou acordar mais cedo ou mais tarde. Vejo-a sentada e olhando para nós de modo enigmático. O que estaria ela pensando? O prazer que projeto nela intensifica ainda mais aquilo que sinto. Meu pênis dança, procura caminhos. A hora é agora.
Ele me olha. Com a respiração cada vez mais profunda, vou me deixando levar pelo turbilhão de sentimentos que me invade e sinto como se toda minha energia estivesse canalizada, neste momento, em meu clitóris. Uma mão ainda segura firme a borda da cadeira enquanto a outra se mantém entre minhas pernas. E sinto como seria bom ser tocada agora. Bem assim...
Sinto ela toda úmida. Meu dedos mapeiam a região desconhecida como se nunca dantes. Desfecho um único golpe e a penetro de uma vez, sem avisos, sem dó. Vou sentindo meu pinto se enterrando nela, e forço pra que ele entre mais fundo. Sinto o corpo dela se arqueando sob meu peso e minha fúria. Eu não consigo conter um sorriso e suspiro no seu ouvido, quase como um gemido: calma! Sinto ela lutar comigo, mas vou dominando cada fibra do seu corpo, vou me fundindo, entrando na mesma sintonia. Ela vai arrefecendo. Ela se entrega. Eu vou fazendo leves movimentos, enquanto afundo meu rosto nos seus cabelos. Vou me colocando mais fundo, mas sem forçar demais. Já fui aceito e agora posso me movimentar com mais delicadeza. Sinto meu pinto abraçado por um calor, o vai-e-vem começa a chapinhar. Como ela está úmida! Seguro seus peitos e os beijo, mordendo levemente os mamilos. E olho para o lado, na cadeira, para ela. Seu olhar encontra o meu e eu enrijeço. Titubeio. Mas seu rosto marcado se desfaz em um sorriso de anuência. Como uma onda atingindo a praia. Vejo que sua calça está desabotoada e sua mão está dentro dela.
De onde estou, posso ver perfeitamente seus corpos diante de mim. Ao vê-lo penetrar-lhe, sinto a ardência como se todo aquele prazer invadisse meu corpo em uma explosão incontrolável. Não consigo me conter, como se minha mão não mais me pertencesse e transferisse a mim toda troca de carícias, toda imprevisibilidade, todo ardor da cena em frente a mim. Meu corpo se contorce, meus músculos vão se enrijecendo, e sinto o prazer angustiante que antecede o gozo. Que vem e me larga contra a cadeira, com os braços e pescoço amolecidos, a pálpebra fechada e um silêncio ensurdecedor que passa a ignorar todos os gemidos ao meu redor.
De repente, me sinto carne. Só carne. A violência no vai-e-vem inicial me paralisa, me contrai, me incomoda. Sinto-o entrar em mim como uma faca que rasga meu peito, furando minha alma, partindo-a ao meio e expelindo-a de mim. Só então me apercebo da guerra que se trava entre nossos corpos. E seu pedido de paz, sussurrando ao meu ouvido: "calma". Não quero calma! Quero devorar-lhe, sentir-lhe me invadindo e deixando, com isso, parte de si em mim. Quero, pelo movimento do meu quadril, sugar dele todo o prazer no deslizar daquele membro que me penetra e me queima. Daí, na medida em que o ritmo de nossos corpos se dissolve, luto para não me entregar completamente ao prazer. Esse maldito prazer que me liberta, mas me encarcera.
Pensamentossedissolvemcomoareiaaobateraondaeeujánãoconsigomaissaberondestou
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Eu. Dor. Sinto. Calor. Louca. Sangue corre. Voa. Ah. Uhn. Meu Deeeeeeeeuuuuuuus.
Ouvir os gemidos que viram gritos, meus dedos doem e as lágrimas descem uma a uma enquanto vou me sentindo como nunca antes, num prazer meu e deles. Ninguém me toca como eu e as lágrimas cessam enquanto eu arqueio e sinto meu corpo todo tremer e gritar de prazer.
Mal consigo me sustentar ainda. Espasmos retardados me fazem sentir em menor intensidade, mas ainda, o doce gosto da gozada que acabei de dar. Me sinto exausto, mas leve. Um zumbido no meu ouvido. Me largo na cama. Será que devo abraçá-la? Não ouso abrir meus olhos. Não ouço nenhum barulho e isso me assusta. Nem mesmo a respiração dela. Nada. É como se tudo tivesse se extinguido ao chegarmos ao ápice. Abro um olho. Ela está na cadeira, lívida. Será que está chorando? Nesse segundo sinto um movimento brusco do meu lado. Ela se levanta e se afasta. Não consigo ver seu rosto. Será que ela está sorrindo? Por que imagino um sorriso de escárnio ali? Ela se abaixa e pega suas roupas, procurando aqui e ali.
- Você quer beber alguma coisa?
Para falar a verdade, não quero. Mas respondo que sim, meio que sem pensar muito. Já estou imóvel há alguns minutos, catatônica, em um pensar sem-pensar que diz... Sinto meu corpo nu de uma nudez estranha, de uma pele crua, presente e translúcida. Como se tudo que eu sou estivesse sendo, neste momento, desvendado pelo olhar alheio. Cubro-me com o lençol.
-Eu também quero.
Desvio o olhar por um instante. E realmente quero, não necessariamente a bebida. Quero, por exemplo, entrar em cena, minha cena, minha vez. Me levanto e vou até o banheiro. Fecho a porta, observo minha imagem no espelho. Dou um sorriso maroto.
-Obrigada.
Sento, pego o copo na mão e o coloco ao lado, na cabeceira. A ausência dela ainda se faz presença, no vazio da cadeira, no ar, no pensar, no silêncio, no incômodo, na expectativa de que logo retornarão do banheiro: ela e seu olhar. Nua, invejo e cobiço, por um instante, o lugar do observador.
Vejo-me aqui, com ela ao meu lado, e minha cabeça gira. Tento recordar todos os movimentos e sensações há muito pouco vividos, como se não quisesse deixar escapar nada daquilo. Mais uma vez, o silêncio. Não sei exatamente o que dizer a ela. Ficamos uns instantes em silêncio. Penso em soltar uma piada, ou algum comentário qualquer, só para quebrar o incômodo silêncio. Mas nada me vem à cabeça. Somente eu e ela, e ela, ali, há pouco. Olho para seu rosto. Ela está distante, pensativa. Queria invadir seu pensamento, saber o que pensa. A insegurança me invade de novo. Penso em perguntar se aquele tom agudo de seus olhos deveriam significar alguma coisa para mim. Mas não encontro as palavras. Apenas olho. E olho. E olho... Ela, assim, tão nua, tão perto, tão distante, tão linda. Desejei-a com ardor e com mais ardor a tive. Mas não a tenho, de fato. Ela, neste momento, não me olha. Se arrependeu, talvez? Impossível! Ou seria possível? Sei lá. Nunca sei, ao certo, o que ela está realmente pensando. Gosto disso nela. Encosto, de leve, em seu cabelo. Ela olha para mim, sorri e fecha os olhos.
Por que será que ela não volta? O que será que ela está fazendo lá, sozinha, naquele banheiro? Lembrar-me dela me causa certa angústia. O que será que ela está pensando agora? Sinto-me, mais uma vez, vulnerável, refém. Deveria ir vê-la, talvez? O que está acontecendo?
- Já venho, ok?
Ele entra no banheiro e eu entro em mim. Olhando para mim mesma, por aquele espelho de teto, retomo meus objetivos ao ter aceito este convite e me sinto bem comigo mesma, agora que estou aqui, sozinha novamente. A apreensão do início foi embora; enfim, o fim. Ou seria o começo? Penso que logo abrirão aquela porta e sairão do banheiro, mas a expectativa dos olhares não me amedrontam mais. Eles não podem levar embora minha alma, meus pensamentos, minha satisfação. É. Estou inteira.
- Tudo bem? Posso entrar?
Entro no banheiro um pouco apreensivo. Vejo-a em frente ao espelho e agarro-a pela cintura. Ela olha para mim e sorri, e não é preciso dizer mais nada. Beijo-a longamente e sinto o conforto e o prazer de me aproximar, de novo, daquilo que é familiar a nós.
Com ele aqui, me sinto segura e completa. Meu corpo arde em desejo e colo meu corpo no dele como se quisesse fundi-los em um. Desejo, agora, mais do que nunca, tomar aqui o lugar dela, ser ela, mas sendo eu. Penso naquele banheiro como um oásis no deserto. Um pequeno espaço habitado por apenas dois, com água e sombra fresca, acalanto e intimidade, brisa e ardor. Ela, em pensamento, torna-se novamente presença, mas agora em ausência. Mas concordo com ele que é preciso sairmos dali. Me convenço de que valeu a pena, apesar das angústias vividas ali. Ele voltou a mim. Ele é meu. E isso me basta. Pego-o pela mão, abro a porta, um pouco receosa. Imagens daqueles corpos em ardência me invadem, e a tensão da insegurança se funde novamente com o tesão. Gosto dessa sensação e sigo os passos a diante.
Para minha surpresa, e alívio, ela não está mais ali.
- Enfim, sós.
- Enfim, nós.
Ele me abraça e eu me sinto protegida. Nosso abraço é longo e quente. Ainda pareço sentir o cheiro que não é dele ali, mas vou me fundindo ao seu corpo nu e sinto sua respiração nos meus cabelos. Sinto seu corpo se afastar do meu, ainda que ele mantenha os braços ao meu redor e sua cintura colada na minha. Ele me olha e abre um sorriso, a princípio tímido. Sua boca se aproxima da minha, como ela sempre costuma fazer, mas parece agora outra boca, parece que todos os nossos gestos de carinho ganharam um novo significado. Ele me beija ardentemente e eu volto a sentir pontadas e calores. Ela já não existe mais. Vou me largando na cama, enquanto seus braços fortes vão tirando a minha blusa. Ele é meu, mas ele é outro. Eu o amo.
sábado, 15 de maio de 2010
Renúncias - 3 - Gui(nada)
ATENÇÃO - este post possui conteúdo erótico. Antes de lê-lo, recomendo que leia o Introito
A primeira coisa que eu consegui discernir nas imagens que passavam diante de mim foram aqueles olhos. Como sempre, olhos penetrantes, curiosos e sorridentes. Por mais que não se pudesse ler um sorriso naquela face de anjo, podia-se ler no olhar uma marotice que às vezes, se travestia de inocência e doçura, e às vezes, mostrava-se o olhar de um predador segundos antes de atacar a presa.
Depois de encontrar aqueles olhos, que me fitavam de volta fixamente, fui discernindo o resto, o rosto no qual aqueles olhos se enquadravam, os óculos que pareciam repousar sobre aquele nariz de forma preguiçosa e displicente, jogados pra frente, talvez com uma certa inveja, ou medo do que aqueles olhos poderiam ser capazes, olhos estes que eles tentavam emparedar vitraceamente. Ficaram mais evidentes os contornos dos olhos e o supercílio, com aquele piercing que também parecia estar ali por obra do acaso, e não por deliberação cuidadosa. O foco foi abrindo, uma testa larga acompanhava o contorno do rosto. E o sorriso? Um sorriso meio tímido e também maroto, irmão gêmeo malvado dos olhos. Mas o sorriso era farto e de dentes alinhados, perfeitos. Como uma flor rebelde, ele se abria de quando em quando, apenas em certos momentos. Nessas horas, qualquer pessoa que estivesse ali se sentiria mal de não ter uma câmera fotográfica, ou lamentaria não ter herdado talentos de um Rafael ou um Delacroix para imortalizar tal instante.
Ampliando mais a visão, vejo o corpo todo de relance. Uma camiseta justa colada a um torso bem trabalhado e braços fortes, mas ambíguos com relação ao fato de terem sido conquistados a duras penas numa academia. Tudo ali parecia um grande por-acaso, um amontoado de átomos que virou gente, mas um amontoado muito bem desenhado.
Desvio o olhar, pois a quantidade de beleza contida naquele pedaço de universo cega e machuca os olhos. Contudo, uma espécie de força oculta, que se move dentro de mim como uma lombriga nervosa, força meu olhar de novo a encontrar aquele olhar que me fita e captura com aquele sorriso que se abre convidativo em reconhecimento. “Oi!”
Respondo envergonhado, “Oi! Tudo certinho?” Envergonhado, por talvez ter denunciado o embevecimento que ele me causava, mas curioso para saber o que havia por trás daquele olhar.
“Tou acabando a semana de provas! Tou ficando doido com isso.” É. A conversa vai se manter no mesmo nível de sempre, agradável mas superficial.
“Espero que você consiga se sair bem. Vou enviar umas energias positivas pra você”. E fico nervoso, sinto minha mão suando. Por que eu falei isso? Eu sei que ele é cético. Talvez ele nem acredite em poder da mente, e energias. Mas pelo menos ele pode pensar que eu penso nele fora deste ambiente. Que eu penso nele!
Nele. NELE. Não entendo como as pessoas podem ficar aqui tão estoicamente tranquilas com a presença dele. Elas deveriam se sentir menores, inferiores, monstruosas, mas elas ficam ali apenas o olhando e o tratando como uma pessoa normal. Ele é normal, até demais. Irritantemente normal como muitos outros garotinhos bonitinhos, presos a uma ética sexual ultrapassada, e... Bom, poderia elencar aqui frases de um despeitado, apologias a um orgulho ferido por não poder jamais ter acesso a um tipo de beleza transcendental, mas prefiro caminhar mais alguns passos adiante.
“Posso te fazer uma pergunta?” a tela branca, o cursor, as letras nervosas pulando na tela. “Pode, ué.” Agora sou eu que estou na posição de presa, e ele na de predador. Protegido pela virtualidade da realidade da internet, podendo dar a cara a tapa, será que ele não percebeu a gravidade da pergunta que eu fiz? Será que ele se faz de tolo ou se deixa levar, ciente de que algo está errado, mas não sabendo exatamente o quê? “É que eu tenho uma curiosidade”... Acho que agora me entreguei. E ele percebe, ainda que morda a isca: “Lá vem” E eu aproveito a deixa e vou mesmo.
“Você aceitaria sair um dia comigo, pra tomar uma cerveja ou algo do gênero? Pra gente conversar?” Pra que eu faço isso comigo mesmo? Ele nunca vai aceitar. “Pra tomar uma cerveja sim, ué... Você é meu amigo, né?” Amigo? Amigo. É, né? Será que não conseguiria tirar dessa amizade, o mesmo prazer sensorial do qual só tenho vislumbres ao chegar perto dele? No momento em que, desconfortavelmente – me sinto conseguindo apenas migalhas –, apertar a mão dele, e talvez, passar a mão na sua cintura, pra dar um tapinha nas costas. Será que um dia vou abraçá-lo? Amigos se abraçam. Será que um dia ele vai estar me esperando em um Jaguar branco na frente do meu prédio, pra me levar pra um castelo com bandeiras de arco-íris? Ou será que voaremos até fim do arco-íris? É. Pra pensar assim só sendo tão ridículo quanto as cartas de amor do Pessoa. Como uma menina de quinze anos, esperando o príncipe. Imbecil. Um amontoado de bobagens. Não é isso que eu sinto, mas percebo algo. Percebo que não existe paixão, não existe amor, seria então apenas tesão? Apenas tesão, e nada mais.
(***)
“Bom, finalmente aqui estamos. Gostou do lugar?” perguntei, com objetivo de quebrar o gelo. Podia sentir no ar – junto com o cheiro de cigarro e de algum produto de limpeza barato com o qual deviam ter acabado de limpar a mesa à qual nos sentamos –, um certo medo ou desconforto. Difícil definir qual dos dois, já que o medo causa certo desconforto, ainda que a recíproca não seja verdadeira. Mas ali estávamos. Cara a cara. Sem nenhum obstáculo, como o de não ter tempo ou de pessoas conhecidas olhando. Só nós, ainda que apenas eu e ele. Um nós apenas discursivo e plural de eus, não fusão. Eus tão diferentes, tão distantes de si, ainda que sentados ali, separados apenas por uma mesa de madeira de armar. Aparentemente desarmados.
Um silêncio que parecia amplificar os sons à nossa volta, percebi a impossibilidade de estarmos ali, de aquilo ser real de qualquer forma. Quem eu estava tentando enganar? Não era óbvio que o meu desejo exalava por cada poro da minha pele? Não era visível o modo como eu olhava pra ele, tentando adivinhar todas as formas que se ocultavam entre tecidos a partir do que era revelado na nudez da pele? Pra minha alegria, era verão!
“Lembra aquele papo que tivemos uma vez sobre honestidade?”, comecei, pra poder novamente acabar com aquele silêncio incômodo e ao mesmo tempo tão necessário, pra que eu tivesse uma chance de medir bem as palavras. “Lembro” disse ele, debruçando-se sobre o cardápio e olhando atentamente para as opções do que poderia tomar. Porra, ele não tinha vindo aqui pra tomar um chopp comigo? Por que tinha que ficar olhando pra droga de cardápio plastificado e engordurado e cheio de coisas óbvias? Uma cerveja num bar custa sempre a mesma coisa, e assim por diante todas aquelas bebidas? Então por que não me dar atenção?
“Por quê?”
“Bom, porque às vezes eu sinto que quero te falar certas coisas, coisas que se passam no lado mais negro da minha alma, mas sinto que não devo, em respeito a você.”
“Olha, meu, eu acho que sei onde você quer chegar. Não acho que você precise voltar nisso. Você sabe minha opinião. Eu te respeito, mas não aceito essa tua escolha. Sou um cara careta. Acho que você é um cara super bacana e vai encontrar uma pessoa bacana também, que goste das mesmas coisas que você. Somos só amigos. Só isso.” Percebi que, para ele, chegar neste ponto tinha sido complicado. Conhecendo o seu acabrunhamento, uma timidez que se confundia com auto-proteção, vi que só havia uma alternativa de me livrar daquele peso que me oprimia o peito. (Eu e minha mania de achar apenas uma opção para solucionar os problemas, e normalmente a mais idiota de todas).
“Você sabe o que eu quero?” disse em tom de desafio, enquanto me concentrava em suas pupilas, que pareciam se dilatar e se ampliar. Eu parecia conseguir enxergar os poros de sua testa se abrindo também.
“Sei. E não vai ser nada fácil conseguir.” E sorriu enquanto chamava o garçom. Um sorriso de certa forma maldoso, em reflexo ao meu olhar desafiador.
“Veremos”, foi o que pensei. E senti o diabo dançar no meu corpo.
(***)
O carro deslizava devagar pelo asfalto... As janelas, meio abertas, faziam entrar um vento cortante com cheiro de noite. Ele dirigia com a cara fechada. Silêncio. Nem o rádio ligado, um CD provavelmente daria conta de encher o silêncio que então se impusera sobre nós, mas ele preferia o silêncio.
Percebia que ele estava contrariado, ainda que dirigisse sem nenhum tipo de insegurança em direção ao lugar que eu havia indicado. O vento frio no rosto, a presença dele ali ao lado, quente, humana, davam uma sensação onírica à situação. Tudo parecia uma grande mentira. Tinha que ser, pois eu nem sabia como imaginar ou idealizar a situação em que havia me metido.
Ele para o carro no meio-fio. Percebo a dúvida em seus olhos. Realmente, ninguém consegue dar conta de se deixar levar sem luta. Mas trato é trato. Sai pra lá, Mefistófeles, te botei no chinelo com meu Fausto pós-moderno. Eu sorrio.
“Eu tou um pouco assim, tipo, vai ser muito estranho entrar com um cara.”
Claro, a desculpa da porta do motel. Como se a atendente já não visse de tudo nessa cidade louca que a gente mora. “Olha, o pessoal desses lugares tá acostumado a ver de tudo. Eu já fui lá algumas vezes e sempre foram muito simpáticos. Se você quiser, posso dirigir até lá e entrar, se você não quiser falar nada.” Menti, é claro. Era a primeira vez que ia ali, e não sei se ia saber como guiar o carro. Mas mexi com algo ali, com a posição de macho-alfa, que não admite se submeter. Estava querendo tirar dele o controle? Ele estava entrando no jogo:
“É, você tá certo, pagando bem que mal tem?” e riu. Um riso nervoso. Então percebi que estava diante de uma espécie de virgem, de uma pessoa que estava morrendo de medo do que estava pra acontecer, mas senti o cheiro de curiosidade, se não pela coisa em si, pelo menos por saber até onde as coisas podiam chegar.
Abri a porta com certo misto de excitação e medo. Eu também não sabia aonde aquelas coisas iam nos levar. Tudo tinha que ser bem medido, tudo muito devagar, sem ir com sede demais ao pote. Ele colocou sob o móvel sua carteira e as chaves do carro. Olhou bem ao redor. Sentou-se na cama. Eu fui direto ao banheiro e displicentemente com a porta aberta, meio que provocante, impondo já uma certa intimidade recém-criada, mijei. Quando saí do banheiro ele continuava na mesma posição, sentado na cama, com as mãos sobre as coxas, cabisbaixo, olhar perdido. Me aproximei e com as costas da mão, fiz uma carícia no rosto dele. Ele se aborreceu. Fechou a cara. “Meu... Eu acho que não vai rolar e...” Eu o interrompi. A mesma luta. Resistência.
Bom, todo mundo começa por baixo. Me abaixei, puxei as extremidades dos cadarços dele, e com as duas mãos tirei um tênis, depois o outro. Sem olhar pra ele, falei firme: “Deita”.
Ele relutou, mas deitou de barriga pra cima. Peguei no pé dele e comecei a massagear. Se você quer comer o filé, primeiro tem que amaciar a carne, não? Fui acariciando e apertando o pé dele, primeiro o direito depois o esquerdo. Enquanto massageava, tirei as meias e as joguei no chão. Percebi que ele havia fechado os olhos. Algo zumbia no quarto, não sei se era a lâmpada ou algum outro aparelho naquele cubículo com cheiro duvidoso e limpeza quase hospitalar. Ali na minha frente aquele corpo inerte, porém quente. Tentava fechar os olhos e experimentar a sensação que era tocar naquela pele estranha, quente e macia... Tentava, como nunca, me aproveitar do silêncio e ouvir a respiração dele. Adivinhar seus pensamentos.
Fui subindo a mão e apalpando as suas panturrilhas. Elas eram duras, modeladas. Sentia uma certa contrariedade por estar apalpando por cima do jeans, mas tinha medo de dar um passo maior que a perna. Paciência. Fazê-lo tirar a calça era algo muito complicado. Ele poderia se sentir exposto. Ainda não.
Decidi interagir com aquele corpo silente e inerte. Tirei meus sapatos com meus pés, e escalei a cama até ficar ajoelhado ao lado de onde ele estava com a cabeça.
Me abaixei até perto do ouvido dele, e vi que ele havia aberto os olhos, creio que curioso pela movimentação que eu estava fazendo. Sussurrei ao seu ouvido. Algumas coisas soam melhor quando apenas levemente sussurradas. Escolhi brincar com ele e fingir um clima: “Você poderia se virar de costas?” Ele não respondeu. Não se moveu, tampouco. “Confia em mim!” Então, ele se moveu bem devagar, como se tivesse que lutar com cada fibra do seu corpo, que relutava em obedecê-lo. E novamente fechou os olhos. Fui passeando os dedos por toda extensão das costas, procurando cada centímetro da pele, conhecendo e tateando cegamente uma terra inexplorada, ainda que por sobre a camiseta. Fechei os dedos nos seus ombros e comecei a fazer movimentos leves, depois mais fortes. Fui ampliando a área de toque e fui descendo por toda a coluna, até atingir a base dela. Com as duas mãos, empurrei para cima a barra da camiseta, desnudando metade daquele dorso cor de cobre e liso como uma maça. Empurrando a roupa, já alisava aquela pele quente e macia. Ele estava amolecendo diante da massagem, permitindo mais... Puxei a camiseta, e ele meio que se levantou para permitir tirá-la, mas ela se enganchou nos óculos, os quais dele tirei antes de terminar de tirar a camiseta. Percebi que os óculos haviam deixado marcas de seus apoios no nariz dele.
Fui tocando naquela imensidão de pele, mais do que tinha tido acesso até então, e me curvei para poder sentir o cheiro que tinha aquele calor que queimava minhas mãos, atraindo-as como ponteiros de uma bússola ao norte que, naquele segundo, ele personificava. Senti um cheiro suave e acre de suor, mesclado com o perfume de desodorante ou sabonete, não saberia dizer. Fui me curvando e quase encostei meu nariz nas suas costas. Enquanto isso, minhas mãos descansavam da massagem, apenas passeando distraídas, acariciando, sentindo, escorregando pelos lados daquele dorso, sentindo o encaracolado dos pelos das axilas. Comecei a desenhar com a ponta do nariz naquelas costas, criando trilhas imaginárias, descendo pelo veio de sua coluna, sentindo o calor e o odor, que já faziam parte de mim. Contudo, ainda havia algo de estranho, a inércia daquele corpo quente e calado me intrigava. O que ele estaria pensando? Estaria ele se imaginando na cama com uma garota? Será que ele pensava em formas de sair dali? Beijei levemente o ponto onde o meu nariz havia parado seu movimento distraído. Nenhuma reação. Nenhum sobressalto. Estaria ele morto? Continuei a beijar cada centímetro de suas costas, ao redor das omoplatas, os ombros. Abri mais a boca e comecei a mordiscar bem levemente aquela pele já umedecida pela minha própria saliva que se misturava ao seu suor. Fui mordiscando levemente, mas aumentando a velocidade com que mordia, dando passagem a uma voracidade, uma urgência, como se precisasse me alimentar do que quer que houvesse ali para matar a fome.
Fui chegando na nuca e ali pude me perder por alguns segundos. Foi então que houve alguma reação. Haveria eu despertado o dragão? Abri os olhos, mas continuei com as mordiscadas, ousando passar os dedos entre seus cabelos. Ele arqueou o corpo, o que me desequilibrou, e me fez ficar de joelhos novamente ao lado dele na cama. Em um único movimento, como o de um peixe na praia se debatendo para tentar voltar para a água, ele se virou de barriga pra cima. Pude ter uma visão daquele peito peludo, e daquela barriga que, ainda que não definida, era tampouco saliente. Subia e descia ao movimento do ar que entrava e saia e, novamente, como uma força magnética, minhas mãos foram se aproximando e passeando, sentindo. Sentia que não podia deixar intocado nem um milímetro de pele. Olhava aqueles mamilos rijos, talvez por reação à leve brisa que entrava pela janela, e evitava tocá-los porque queria deixar o melhor para o final. Volteei o umbigo, fazendo meus dedos tocarem de leve em forma de espiral, até que com o polegar e o indicador comecei a beliscar os dois mamilos. Ele riu, como se tivesse cócegas, e falou: “Não!” Eu estremeci. Droga! Movimento errado. Eu ainda devo dar a ele a impressão de estar no comando. Comecei a massagear novamente o peito, as laterais. Tocava de leve nas axilas, que se mostravam em seu esplendor, já que ele havia jogados os braços para trás e um cobria os olhos. A garganta secava e minha boca fazia cócegas, ela queria participar. Me curvei novamente e repeti o que havia feito nas costas, passeando com o nariz por apenas alguns segundos antes de começar a lamber o que quer que houvesse ali. Evitando por enquanto os mamilos, fui lambendo e sentindo o gosto de sal e de perfume. Num movimento ousado, lambi em volta das axilas, o que fez com que bruscamente ele recolhesse os braços e vedasse minha passagem por aquela parte tão heterodoxa do seu corpo. “Eu tenho cócegas!”, disse rindo, e percebi pela primeira vez na noite um sorriso autêntico, aquele sorriso pueril do qual eu era fã. Sorri também. Fui me aproximando aos poucos, queria capturar aquele sorriso pra dentro de mim, queria devorá-lo. Não sei se foi meu calor, ou algum pressentimento, mas a cinco centímetros de meus lábios tocarem dele, abriu os olhos e vi o medo se estampar. Ele virou o rosto. “Ow, ow ow... sem beijo! Isso não rola mesmo!” Isso me paralisou. Uma onda de fúria (ou seria vergonha?) subiu ao meu rosto, inflamando-me. “Mas, meu...”, e dessa vez foi ele que me interrompeu. “Acho melhor a gente parar. Não ia dar certo mesmo, e ...” Eu tinha que pará-lo. Tinha que virar o jogo. Pensa rápido, pensa rápido. “Beleza! Eu tava mesmo forçando a barra. Desculpa, de coração, mas não vamos estragar o que tava tão legal. Não tava gostoso até agora?” Desviei o olhar, pois não queria ouvir ou ver nenhuma expressão que pudesse contradizer o que eu estava sentindo. “Faz o seguinte”, continuei, “deixa eu continuar a massagem, pra pelo menos você ficar relaxado. Tira a calça, pra eu poder fazer direito nas panturrilhas.”
Recebi um olhar desconfiado. De novo, pensei que havia me movimentado rápido demais. Mas ele balançou a cabeça, recostando novamente na cama, e levando as mãos até o botão e o zíper. Parecia que se movia em câmera lenta, e eu senti um calor subindo por minhas coxas, alojando-se na virilha. De novo aquela cena parecia tão sublime, quase irreal. Ele desabotoou a calça, e lentamente – o que parecia para mim uma eternidade –, desceu o zíper. Segurando pelas barras, fiz a calça deslizar por suas pernas e a joguei no chão perto de onde havia jogado as meias.
Pude então observar aquelas coxas que antes só se delineavam sob o tecido, e notar o volume que ainda se mantinha oculto sob uns centímetros quadrados de tecido. Ele notou meus olhares e se envergonhou. “Você não vai continuar a massagem?” Saí daquele torpor contemplativo e baixei os olhos para observar os já conhecidos pés e o restante da perna. Resignado, mas ainda contente, ajoelhei-me no chão, fora da cama, e comecei a fazer movimentos nas panturrilhas e na canela. Ali fiquei entretido, fui me perdendo em pensamentos, de novo refletindo sobre a total sensação de irrealidade que aquela situação me provocava. Ele voltou ao seu estado inerte, e eu ficava imaginando o que ele poderia estar pensando naquela hora. Quando já havia me aborrecido de massagear aquela região, decidi ousar e comecei a massagear os joelhos, rapidamente mudando para as coxas. Nenhuma reação.
Foi neste exato momento que tive a ideia: se não pode vencê-los, junte-se a eles. Decidi que não podia atacar diretamente, tentaria de uma forma mais velada. “Posso te fazer uma pergunta?” lancei. “Lá vem!” e a resposta dele já se tornava uma constante. “Como foi sua melhor transa?” Ele ficou em silêncio por alguns segundos resolvendo dar a resposta mais comum. “Foi legal, muito excitante.” E o silêncio. Será que ele achou que uma resposta simples dessa poderia me apaziguar? Percebo que estou apertando-lhe as coxas em movimentos repetitivos e quase mecânicos. “Já que é tudo o que vou conseguir de você, por que não me conta com algum detalhe como foi?” Com qual objetivo as pessoas respeitam as vítimas? Será que Nietzsche não ensinou bem a lição de que a piedade é a miséria que constitui o homem moderno? “Bom”, ele mordia a isca de novo, “foi com minha ex-namorada. Estávamos na praia, o pessoal saiu da casa onde ficamos hospedados, indo pra praia, e nós ficamos pra trás. Só eu e ela. Ela não queria, eu tava já com muito tesão, por ela estar só de biquíni e canga.” Continuei a massagem e esbocei um sorriso que tentei esconder olhando para o outro lado. “Sério?”, soltei, forçando um pretenso interesse nessa história tão alheia a nós, àquele momento. Ele continuava. “Ela dizia que a qualquer momento alguém podia voltar, e eu dizia pra ela que não tinha que se preocupar porque a gente ouviria alguma coisa. Ela não queria ceder e isso foi me deixando com mais tesão. Ela inclusive começou a se afastar de mim e mandar eu me controlar porque ela não ia conseguir se segurar muito.” Enquanto ele contava essa parte da história, eu fui subindo minhas mãos na coxa dele, ainda massageando, consegui fazer as costas da minha mão tocarem o tecido da cueca. Afastei um pouco suas pernas, e com o dedo mindinho podia tocar-lhe levemente o saco, de uma forma bastante disfarçada, como que acidental. E ele continuava, ignorando este meu movimento “Daí eu coloquei ela contra a parede, ela pedia pra eu parar e aquilo ia me deixando mais e mais excitado, fui passeando a mão pelo corpo dela e fui pondo a mão por dentro do biquíni. Ela gemia, não pedia mais pra eu parar, só gemia baixinho que era melhor não, que tava tão gostoso, e eu não conseguia parar... O peito dela inchava na minha boca, o mamilo super duro, e eu ia pressionando ela contra a parede, lambendo a orelha e...” E ele engasgou. Não conseguiu terminar a frase, olhei pra cima e entendi o porquê. Meu plano tinha dado certo. Não sei bem se por causa das minhas carícias pseudo-acidentais ou pelas lembranças que a história devia estar causando nele, o corpo estava reagindo e o pinto dele estava duro, latejando e lutando contra a falta de espaço, pois a cueca mal conseguia contê-lo. Ele percebeu meu olhar e foi como se tivesse levado um choque. Fechou ambas as mãos em forma de concha e colocou sobre seu membro que mal cabia sob essa precária proteção. Era minha hora de agir. Tinha que ser agora. “Ela te chupou?”, como se eu não tivesse percebido nenhum movimento, continuei. “Não. Ela não gostava muito disso não”, disse ele, meio contrariado. Foi uma questão de segundos. Com uma mão, empurrei a proteção que ele havia feito com as mãos para o lado, e com a outra, puxei um pouco a cueca. Ainda estava meio duro, e saltou para fora. Ele tentou empurrar minha cabeça pro lado, mas eu já havia me abaixado e lambia seu pinto de baixo pra cima. Quando cheguei à glande, que estava recoberta pelo prepúcio, fiz pequenos movimentos com a língua, e seu pênis vibrou, endurecendo totalmente. Ao endurecer, ele se elevou um pouco e aproveitei para colocá-lo dentro da boca. Engolindo cada centímetro daquele membro, ia sentindo como se estivesse aplicando alguma espécie de anestesia, pois suas mãos já não mais empurravam a minha cabeça e ele já não mais debatia as pernas numa tentativa de se sentar ou se levantar. Fui aproveitando a velocidade com que tinha feito aquilo – meu coração batendo aceleradamente, meu pinto endurecido, mas preso pela calça, incomodando –, para fazer movimentos mais e mais intensos e velozes. Será que eu o havia matado? Não havia mais sons ou movimentos por parte dele. Apenas um corpo, os olhos fechados e um pinto duro.
Com uma das mãos, eu segurei a base do pênis para que eu pudesse evitar uma posição na qual minha boca pudesse machucá-lo. Com a outra, fui abrindo meus zíper e botão. Finalmente havia atingido o que queria, mas havia algo errado. Eu queria mais. Tirei a boca com cuidado, com medo de fazê-lo despertar daquela catatonia, e com uma mão, mantive o movimento frenético da masturbação, fazendo movimentos repetidos com o dedão e com indicador, aproveitando a lubrificação da minha saliva. Com a outra mão, tentava me livrar da calça e da camiseta. Já não conseguia mais pensar direito, já não conseguia mais jogar.
Estava apostando que havia dado a partida, havia derrubado a primeira peça de um efeito dominó, e que seria impossível para ele voltar dali. Enquanto o masturbava, pude perceber pela primeira vez de verdade o que era aquilo que tinha na mão. Um pinto não muito grande, mas grosso, pelo menos mais grosso que o meu. Bastante rico em veias, mais claro do que esperava, pelo tom de pele dele. Um prepúcio abundante e que revelava apenas a pontinha daquela glande rosada, mas não vermelha brilhante. A quantidade de pelos era abundante e era prosseguimento daqueles que se espalhavam pelo seu abdômen. Enquanto computava estes detalhes antes negligenciados, percebi que ele abriu o olho. Ficou olhando para o teto, um olhar perdido, sem me fitar, quase sem vida.
Consegui me desvencilhar da minha calça e tentava com apenas uma das mãos tirar a camiseta. Pronto! Daí, só de cueca e meia, eu fui me arrastando na cama e em um movimento rápido, colei meu peito ao dele, joguei todo meu peso sobre aquele corpo que foi queimando toda minha pele, assim como tinha feito com minha mão. Ele reagiu tentando se livrar daquele abraço que deveria ser para ele bastante incômodo. Mas me aproveitava do fato de estar por cima e tentava manter o equilíbrio e sentia nossos pênis se roçando e eu começava a mover meus quadris para frente e para trás, tentando mantê-lo excitado, tentando mordiscar-lhe o pescoço. Começava a pensar na história que ele tava contando, de como a ex-namorada dele ficava pedindo pra ele parar e o quanto essa proibição fazia com que ele não conseguisse se controlar. É o que dizem, proibido é mais legal. De repente, de uma forma que chegou a me assustar, ele soltou como uma espécie de suspiro e protesto: “Meu, o que você tá fazendo? Para com isso!” Eu não conseguia ter energia para parar, o cheiro do cabelo dele, que esbarrava no meu nariz e boca não me deixava falar. Além, certamente, do esforço que eu estava tendo que fazer pra me manter naquela posição. Só consegui sussurrar entrecortadamente “Não pensa em nada. Atira primeiro e pergunta depois.” Achei uma frase extremamente clichê. Burra. Eu deveria usar outro argumento se quisesse fazer ele prosseguir naquilo. Ainda havia apenas a resistência. E uma resistência deliciosamente pornográfica. Contudo, sabia que a situação precisava se inverter. Ele não suportaria mais estar numa posição de subjugado. Seu adestramento havia sido aquele no qual ele é o grande provedor, o que faz os movimentos, o que leva na dança. Mas sem a motivação, como poderia fazer para que ele fizesse os movimentos? Ele conseguiu agarrar meu pulso com uma das mãos que havia se libertado do meu abraço e começou a empurrar. Tentava usar toda a ajuda que a gravidade poderia me dar e tentava me colar à cama e percebi que o esforço que ele estava fazendo me lembrava do que uma vez alguém me dissera: “Com uma mulher é como manipular uma flor. Transar com um homem se assemelha a uma luta.” Fui deixando ele me ganhar, fui me amolecendo. Achava que já tinha chegado ao ápice do que a fortuna poderia me trazer. Mas daí, com que se soprado ao meu ouvido ouvi uma vozinha: “Percebe que pinto dele está duro ainda?”
Imagens invadiam minha mente. A casa da praia, um lugar onde eu não havia estado, ele e uma menina (sem rosto, pois eu jamais a havia visto), ambos encostados em uma parede. Eu podia até sentir o frio dos tijolos, e o desejo dele aumentando. A luta fazia as coisas ficarem mais quentes. Assim, ainda que houvesse a resistência – e talvez tudo fosse abortado, no momento em que eu parasse de me movimentar –, havia essa contra-força, que criava uma situação inusitada em tons extremamente eróticos. Até que ponto eu precisava ir para conseguir envolvê-lo em uma rede, em uma arapuca, para que a inércia funcionasse e ele continuasse aquela dança de movimentos improvisados e dolorosos? Meus músculos tensionavam, minha resistência estava chegando ao limite. Pingos de suor desciam pela minha testa e nariz. Meus braços já começavam a ficar dormentes, contudo, o cheiro que emanava dele e o calor, que aumentava mais e mais com seus movimentos não permitiam que eu esquecesse onde estava.
Seus esforços para se livrar do meu abraço também diminuíam a cada tentativa frustrada, mas ele percebia que minhas forças estavam se esgotando. Que era apenas uma questão de tempo.
Finalmente, decidi que aquela luta não ia levar a nada. Me joguei para o lado, arfando e sentindo cada poro do meu corpo transpirar. Sentia o lençol grudando na minha pele, mas não conseguia me mover. Olhando de esguelha para o lado, percebia que ele também não conseguia se mover. Com o pinto mole já, também respirava fundo e tentava recuperar suas forças. Eu observava aquele corpo e já lamentava que as coisas tivessem que acabar daquela forma. Reunindo algumas forças, soltei: “Foi uma luta e tanto. Pena que você não consegue ir além.”
Ele abriu os olhos e olhou diretamente para mim. Aquele não era o olhar que eu conhecia. Não havia nenhum traço de marotice, apenas violência e... luxúria?! De repente tudo acontecia rápido demais, meus sentidos eram confundidos pela velocidade das ações e pela improbabilidade de aquilo estar acontecendo. Agarrou meu braço e puxou meu corpo para junto dele, com a outra mão empurrando minha cabeça para baixo. Encostei meus lábios em sua glande e comecei a fazer movimentos com a língua, e logo já estava novamente com a boca cheia de algo pulsante e vibrante. Enquanto fazia movimentos rápidos e famintos, ele esticou o corpo para fora da cama e parecia procurar por algo. Ouvi o barulho tão conhecido de plástico sendo rasgado, e o cheiro de látex invadido o ambiente. Olhei e reconheci o que ele segurava com as pontas dos dedos enquanto olhava para mim, firme e imperativo. Parei de fazer o vai-e-vem e, seguro que se tratava de um blefe, dei licença para que ele pudesse colocar a camisinha. Fiz movimentos de que eu poderia fazer aquilo para ele, mas fui rechaçado de novo com um olhar.. O que o fez mudar de ideia? Aquilo não estava nos meus planos.
Não acreditava no que aquilo significava. Colocar a camisinha era o mesmo que assinar o contrato, entrar deliberada e finalmente no jogo.
De novo, sentia que seu olhar mudara, e a malícia me assustava ao mesmo tempo em que me excitava. Peguei minha mochila, que estava jogada num canto, e trouxe ao cenário um tubo de lubrificante. Entreguei a ele e deitei-me de bruços. Agora eu tinha perdido o controle, era ele quem decidia o que ia fazer. Espalhou o lubrificante sobre a palma da mão, e após molhar os dedos da outra afastou as minhas nádegas, num movimento de alguém que parecia muito senhor de si, ainda que hesitante em procurar o que sabia que encontraria. A frieza do gel se mesclou ao toque quente, dedos perscrutadores massageando e lubrificando. Num salto, aquela vivacidade na sequência de tamanha imobilidade me assustava, ele estava sobre meu corpo nu e fui sentindo seu peso e sua dureza que ia buscando se encaixando em mim. Pensei em me ajeitar para poder estar apto a receber aquilo que ao mesmo tempo me preocupava e me excitava. Nunca imaginei que ele fosse me penetrar, não sei se era exatamente o que eu queria. Senti que a glande já me invadia. Respirei fundo, e tentei relaxar, para diminuir a dor. Soltei um “Vai devagar!”, mas ele parecia não ter ouvido, ou simplesmente escolheu ignorar. Sentiu também que havia entrado e num único movimento, pungente, colocou tudo. A dor se mesclava com a irrealidade, transformando aquilo num pesadelo do qual eu não sentia a menor vontade de acordar. Gemi, e tentei me adaptar àquele volume todo. Antes de qualquer sucesso de minha parte em relaxar, aquele corpo estranho começou a fazer movimentos, mas outra vez, apesar de meu desejo que ele fosse lentamente me possuindo, ele rapidamente acelerava seus movimentos. A dor ia se tornando insuportável.
Sentia lágrimas saindo dos meus olhos, mas ainda assim, não conseguia reunir forças pra pedir que parasse. Sentia que às vezes ele reduzia o ritmo, como se estivesse se contendo, mas depois de alguns segundos retomava seu frenesi. Esses ciclos iam se repetindo, eu sentia o suor escorrendo, e via que já se formava uma poça na cama onde estávamos. De repente, estremeço com a voz dele sussurrada: “Tá gostando, tá?” Por que ele tinha que falar desse jeito? Minha garganta parecia ter dado um nó. Não era só tesão? Não conseguia respirar direito. Seu peso me oprimia. Ele estava sorrindo? Não conseguia me virar para ver o rosto dele, pra investigar seu olhar. Me senti sozinho. Um figurante na minha própria história.
Súbito, ouço ele gemer e seu corpo desaba sobre o meu. Vou sentindo espasmos fortes, seu pênis latejando dentro de mim e a sensação de paz que aquela parada me provocou. Alívio puro. Começo a me perceber, recupero a consciência e percebo que ondas de prazer e surpresa me invadem, ao passo que me excito na hora e virando um pouco de lado, ainda com ele dentro de mim, de volta à sua imobilidade, mecanicamente me manipulo pra que um jato quente me traga paz e libertação.
Sinto que ele respira fundo nas minhas costas. Me afasto de seu corpo e rapidamente me viro. Olho nos olhos dele, mas já não consigo lê-los. Parece que vejo neles uma certa compaixão, um certo escárnio, talvez vergonha, uma expressão indefinida. Desvio o olhar. Quem é ele? Quem sou eu? Só sinto uma estranheza que nem tento explicar. E uma ponta de... orgulho? Talvez. Levanto-me e vou ao banheiro. Ele continua parado na cama, uma estátua. Ligo o chuveiro e deixo o jato frio tentar me explicar o que aconteceu.
A primeira coisa que eu consegui discernir nas imagens que passavam diante de mim foram aqueles olhos. Como sempre, olhos penetrantes, curiosos e sorridentes. Por mais que não se pudesse ler um sorriso naquela face de anjo, podia-se ler no olhar uma marotice que às vezes, se travestia de inocência e doçura, e às vezes, mostrava-se o olhar de um predador segundos antes de atacar a presa.
Depois de encontrar aqueles olhos, que me fitavam de volta fixamente, fui discernindo o resto, o rosto no qual aqueles olhos se enquadravam, os óculos que pareciam repousar sobre aquele nariz de forma preguiçosa e displicente, jogados pra frente, talvez com uma certa inveja, ou medo do que aqueles olhos poderiam ser capazes, olhos estes que eles tentavam emparedar vitraceamente. Ficaram mais evidentes os contornos dos olhos e o supercílio, com aquele piercing que também parecia estar ali por obra do acaso, e não por deliberação cuidadosa. O foco foi abrindo, uma testa larga acompanhava o contorno do rosto. E o sorriso? Um sorriso meio tímido e também maroto, irmão gêmeo malvado dos olhos. Mas o sorriso era farto e de dentes alinhados, perfeitos. Como uma flor rebelde, ele se abria de quando em quando, apenas em certos momentos. Nessas horas, qualquer pessoa que estivesse ali se sentiria mal de não ter uma câmera fotográfica, ou lamentaria não ter herdado talentos de um Rafael ou um Delacroix para imortalizar tal instante.
Ampliando mais a visão, vejo o corpo todo de relance. Uma camiseta justa colada a um torso bem trabalhado e braços fortes, mas ambíguos com relação ao fato de terem sido conquistados a duras penas numa academia. Tudo ali parecia um grande por-acaso, um amontoado de átomos que virou gente, mas um amontoado muito bem desenhado.
Desvio o olhar, pois a quantidade de beleza contida naquele pedaço de universo cega e machuca os olhos. Contudo, uma espécie de força oculta, que se move dentro de mim como uma lombriga nervosa, força meu olhar de novo a encontrar aquele olhar que me fita e captura com aquele sorriso que se abre convidativo em reconhecimento. “Oi!”
Respondo envergonhado, “Oi! Tudo certinho?” Envergonhado, por talvez ter denunciado o embevecimento que ele me causava, mas curioso para saber o que havia por trás daquele olhar.
“Tou acabando a semana de provas! Tou ficando doido com isso.” É. A conversa vai se manter no mesmo nível de sempre, agradável mas superficial.
“Espero que você consiga se sair bem. Vou enviar umas energias positivas pra você”. E fico nervoso, sinto minha mão suando. Por que eu falei isso? Eu sei que ele é cético. Talvez ele nem acredite em poder da mente, e energias. Mas pelo menos ele pode pensar que eu penso nele fora deste ambiente. Que eu penso nele!
Nele. NELE. Não entendo como as pessoas podem ficar aqui tão estoicamente tranquilas com a presença dele. Elas deveriam se sentir menores, inferiores, monstruosas, mas elas ficam ali apenas o olhando e o tratando como uma pessoa normal. Ele é normal, até demais. Irritantemente normal como muitos outros garotinhos bonitinhos, presos a uma ética sexual ultrapassada, e... Bom, poderia elencar aqui frases de um despeitado, apologias a um orgulho ferido por não poder jamais ter acesso a um tipo de beleza transcendental, mas prefiro caminhar mais alguns passos adiante.
“Posso te fazer uma pergunta?” a tela branca, o cursor, as letras nervosas pulando na tela. “Pode, ué.” Agora sou eu que estou na posição de presa, e ele na de predador. Protegido pela virtualidade da realidade da internet, podendo dar a cara a tapa, será que ele não percebeu a gravidade da pergunta que eu fiz? Será que ele se faz de tolo ou se deixa levar, ciente de que algo está errado, mas não sabendo exatamente o quê? “É que eu tenho uma curiosidade”... Acho que agora me entreguei. E ele percebe, ainda que morda a isca: “Lá vem” E eu aproveito a deixa e vou mesmo.
“Você aceitaria sair um dia comigo, pra tomar uma cerveja ou algo do gênero? Pra gente conversar?” Pra que eu faço isso comigo mesmo? Ele nunca vai aceitar. “Pra tomar uma cerveja sim, ué... Você é meu amigo, né?” Amigo? Amigo. É, né? Será que não conseguiria tirar dessa amizade, o mesmo prazer sensorial do qual só tenho vislumbres ao chegar perto dele? No momento em que, desconfortavelmente – me sinto conseguindo apenas migalhas –, apertar a mão dele, e talvez, passar a mão na sua cintura, pra dar um tapinha nas costas. Será que um dia vou abraçá-lo? Amigos se abraçam. Será que um dia ele vai estar me esperando em um Jaguar branco na frente do meu prédio, pra me levar pra um castelo com bandeiras de arco-íris? Ou será que voaremos até fim do arco-íris? É. Pra pensar assim só sendo tão ridículo quanto as cartas de amor do Pessoa. Como uma menina de quinze anos, esperando o príncipe. Imbecil. Um amontoado de bobagens. Não é isso que eu sinto, mas percebo algo. Percebo que não existe paixão, não existe amor, seria então apenas tesão? Apenas tesão, e nada mais.
(***)
“Bom, finalmente aqui estamos. Gostou do lugar?” perguntei, com objetivo de quebrar o gelo. Podia sentir no ar – junto com o cheiro de cigarro e de algum produto de limpeza barato com o qual deviam ter acabado de limpar a mesa à qual nos sentamos –, um certo medo ou desconforto. Difícil definir qual dos dois, já que o medo causa certo desconforto, ainda que a recíproca não seja verdadeira. Mas ali estávamos. Cara a cara. Sem nenhum obstáculo, como o de não ter tempo ou de pessoas conhecidas olhando. Só nós, ainda que apenas eu e ele. Um nós apenas discursivo e plural de eus, não fusão. Eus tão diferentes, tão distantes de si, ainda que sentados ali, separados apenas por uma mesa de madeira de armar. Aparentemente desarmados.
Um silêncio que parecia amplificar os sons à nossa volta, percebi a impossibilidade de estarmos ali, de aquilo ser real de qualquer forma. Quem eu estava tentando enganar? Não era óbvio que o meu desejo exalava por cada poro da minha pele? Não era visível o modo como eu olhava pra ele, tentando adivinhar todas as formas que se ocultavam entre tecidos a partir do que era revelado na nudez da pele? Pra minha alegria, era verão!
“Lembra aquele papo que tivemos uma vez sobre honestidade?”, comecei, pra poder novamente acabar com aquele silêncio incômodo e ao mesmo tempo tão necessário, pra que eu tivesse uma chance de medir bem as palavras. “Lembro” disse ele, debruçando-se sobre o cardápio e olhando atentamente para as opções do que poderia tomar. Porra, ele não tinha vindo aqui pra tomar um chopp comigo? Por que tinha que ficar olhando pra droga de cardápio plastificado e engordurado e cheio de coisas óbvias? Uma cerveja num bar custa sempre a mesma coisa, e assim por diante todas aquelas bebidas? Então por que não me dar atenção?
“Por quê?”
“Bom, porque às vezes eu sinto que quero te falar certas coisas, coisas que se passam no lado mais negro da minha alma, mas sinto que não devo, em respeito a você.”
“Olha, meu, eu acho que sei onde você quer chegar. Não acho que você precise voltar nisso. Você sabe minha opinião. Eu te respeito, mas não aceito essa tua escolha. Sou um cara careta. Acho que você é um cara super bacana e vai encontrar uma pessoa bacana também, que goste das mesmas coisas que você. Somos só amigos. Só isso.” Percebi que, para ele, chegar neste ponto tinha sido complicado. Conhecendo o seu acabrunhamento, uma timidez que se confundia com auto-proteção, vi que só havia uma alternativa de me livrar daquele peso que me oprimia o peito. (Eu e minha mania de achar apenas uma opção para solucionar os problemas, e normalmente a mais idiota de todas).
“Você sabe o que eu quero?” disse em tom de desafio, enquanto me concentrava em suas pupilas, que pareciam se dilatar e se ampliar. Eu parecia conseguir enxergar os poros de sua testa se abrindo também.
“Sei. E não vai ser nada fácil conseguir.” E sorriu enquanto chamava o garçom. Um sorriso de certa forma maldoso, em reflexo ao meu olhar desafiador.
“Veremos”, foi o que pensei. E senti o diabo dançar no meu corpo.
(***)
O carro deslizava devagar pelo asfalto... As janelas, meio abertas, faziam entrar um vento cortante com cheiro de noite. Ele dirigia com a cara fechada. Silêncio. Nem o rádio ligado, um CD provavelmente daria conta de encher o silêncio que então se impusera sobre nós, mas ele preferia o silêncio.
Percebia que ele estava contrariado, ainda que dirigisse sem nenhum tipo de insegurança em direção ao lugar que eu havia indicado. O vento frio no rosto, a presença dele ali ao lado, quente, humana, davam uma sensação onírica à situação. Tudo parecia uma grande mentira. Tinha que ser, pois eu nem sabia como imaginar ou idealizar a situação em que havia me metido.
Ele para o carro no meio-fio. Percebo a dúvida em seus olhos. Realmente, ninguém consegue dar conta de se deixar levar sem luta. Mas trato é trato. Sai pra lá, Mefistófeles, te botei no chinelo com meu Fausto pós-moderno. Eu sorrio.
“Eu tou um pouco assim, tipo, vai ser muito estranho entrar com um cara.”
Claro, a desculpa da porta do motel. Como se a atendente já não visse de tudo nessa cidade louca que a gente mora. “Olha, o pessoal desses lugares tá acostumado a ver de tudo. Eu já fui lá algumas vezes e sempre foram muito simpáticos. Se você quiser, posso dirigir até lá e entrar, se você não quiser falar nada.” Menti, é claro. Era a primeira vez que ia ali, e não sei se ia saber como guiar o carro. Mas mexi com algo ali, com a posição de macho-alfa, que não admite se submeter. Estava querendo tirar dele o controle? Ele estava entrando no jogo:
“É, você tá certo, pagando bem que mal tem?” e riu. Um riso nervoso. Então percebi que estava diante de uma espécie de virgem, de uma pessoa que estava morrendo de medo do que estava pra acontecer, mas senti o cheiro de curiosidade, se não pela coisa em si, pelo menos por saber até onde as coisas podiam chegar.
Abri a porta com certo misto de excitação e medo. Eu também não sabia aonde aquelas coisas iam nos levar. Tudo tinha que ser bem medido, tudo muito devagar, sem ir com sede demais ao pote. Ele colocou sob o móvel sua carteira e as chaves do carro. Olhou bem ao redor. Sentou-se na cama. Eu fui direto ao banheiro e displicentemente com a porta aberta, meio que provocante, impondo já uma certa intimidade recém-criada, mijei. Quando saí do banheiro ele continuava na mesma posição, sentado na cama, com as mãos sobre as coxas, cabisbaixo, olhar perdido. Me aproximei e com as costas da mão, fiz uma carícia no rosto dele. Ele se aborreceu. Fechou a cara. “Meu... Eu acho que não vai rolar e...” Eu o interrompi. A mesma luta. Resistência.
Bom, todo mundo começa por baixo. Me abaixei, puxei as extremidades dos cadarços dele, e com as duas mãos tirei um tênis, depois o outro. Sem olhar pra ele, falei firme: “Deita”.
Ele relutou, mas deitou de barriga pra cima. Peguei no pé dele e comecei a massagear. Se você quer comer o filé, primeiro tem que amaciar a carne, não? Fui acariciando e apertando o pé dele, primeiro o direito depois o esquerdo. Enquanto massageava, tirei as meias e as joguei no chão. Percebi que ele havia fechado os olhos. Algo zumbia no quarto, não sei se era a lâmpada ou algum outro aparelho naquele cubículo com cheiro duvidoso e limpeza quase hospitalar. Ali na minha frente aquele corpo inerte, porém quente. Tentava fechar os olhos e experimentar a sensação que era tocar naquela pele estranha, quente e macia... Tentava, como nunca, me aproveitar do silêncio e ouvir a respiração dele. Adivinhar seus pensamentos.
Fui subindo a mão e apalpando as suas panturrilhas. Elas eram duras, modeladas. Sentia uma certa contrariedade por estar apalpando por cima do jeans, mas tinha medo de dar um passo maior que a perna. Paciência. Fazê-lo tirar a calça era algo muito complicado. Ele poderia se sentir exposto. Ainda não.
Decidi interagir com aquele corpo silente e inerte. Tirei meus sapatos com meus pés, e escalei a cama até ficar ajoelhado ao lado de onde ele estava com a cabeça.
Me abaixei até perto do ouvido dele, e vi que ele havia aberto os olhos, creio que curioso pela movimentação que eu estava fazendo. Sussurrei ao seu ouvido. Algumas coisas soam melhor quando apenas levemente sussurradas. Escolhi brincar com ele e fingir um clima: “Você poderia se virar de costas?” Ele não respondeu. Não se moveu, tampouco. “Confia em mim!” Então, ele se moveu bem devagar, como se tivesse que lutar com cada fibra do seu corpo, que relutava em obedecê-lo. E novamente fechou os olhos. Fui passeando os dedos por toda extensão das costas, procurando cada centímetro da pele, conhecendo e tateando cegamente uma terra inexplorada, ainda que por sobre a camiseta. Fechei os dedos nos seus ombros e comecei a fazer movimentos leves, depois mais fortes. Fui ampliando a área de toque e fui descendo por toda a coluna, até atingir a base dela. Com as duas mãos, empurrei para cima a barra da camiseta, desnudando metade daquele dorso cor de cobre e liso como uma maça. Empurrando a roupa, já alisava aquela pele quente e macia. Ele estava amolecendo diante da massagem, permitindo mais... Puxei a camiseta, e ele meio que se levantou para permitir tirá-la, mas ela se enganchou nos óculos, os quais dele tirei antes de terminar de tirar a camiseta. Percebi que os óculos haviam deixado marcas de seus apoios no nariz dele.
Fui tocando naquela imensidão de pele, mais do que tinha tido acesso até então, e me curvei para poder sentir o cheiro que tinha aquele calor que queimava minhas mãos, atraindo-as como ponteiros de uma bússola ao norte que, naquele segundo, ele personificava. Senti um cheiro suave e acre de suor, mesclado com o perfume de desodorante ou sabonete, não saberia dizer. Fui me curvando e quase encostei meu nariz nas suas costas. Enquanto isso, minhas mãos descansavam da massagem, apenas passeando distraídas, acariciando, sentindo, escorregando pelos lados daquele dorso, sentindo o encaracolado dos pelos das axilas. Comecei a desenhar com a ponta do nariz naquelas costas, criando trilhas imaginárias, descendo pelo veio de sua coluna, sentindo o calor e o odor, que já faziam parte de mim. Contudo, ainda havia algo de estranho, a inércia daquele corpo quente e calado me intrigava. O que ele estaria pensando? Estaria ele se imaginando na cama com uma garota? Será que ele pensava em formas de sair dali? Beijei levemente o ponto onde o meu nariz havia parado seu movimento distraído. Nenhuma reação. Nenhum sobressalto. Estaria ele morto? Continuei a beijar cada centímetro de suas costas, ao redor das omoplatas, os ombros. Abri mais a boca e comecei a mordiscar bem levemente aquela pele já umedecida pela minha própria saliva que se misturava ao seu suor. Fui mordiscando levemente, mas aumentando a velocidade com que mordia, dando passagem a uma voracidade, uma urgência, como se precisasse me alimentar do que quer que houvesse ali para matar a fome.
Fui chegando na nuca e ali pude me perder por alguns segundos. Foi então que houve alguma reação. Haveria eu despertado o dragão? Abri os olhos, mas continuei com as mordiscadas, ousando passar os dedos entre seus cabelos. Ele arqueou o corpo, o que me desequilibrou, e me fez ficar de joelhos novamente ao lado dele na cama. Em um único movimento, como o de um peixe na praia se debatendo para tentar voltar para a água, ele se virou de barriga pra cima. Pude ter uma visão daquele peito peludo, e daquela barriga que, ainda que não definida, era tampouco saliente. Subia e descia ao movimento do ar que entrava e saia e, novamente, como uma força magnética, minhas mãos foram se aproximando e passeando, sentindo. Sentia que não podia deixar intocado nem um milímetro de pele. Olhava aqueles mamilos rijos, talvez por reação à leve brisa que entrava pela janela, e evitava tocá-los porque queria deixar o melhor para o final. Volteei o umbigo, fazendo meus dedos tocarem de leve em forma de espiral, até que com o polegar e o indicador comecei a beliscar os dois mamilos. Ele riu, como se tivesse cócegas, e falou: “Não!” Eu estremeci. Droga! Movimento errado. Eu ainda devo dar a ele a impressão de estar no comando. Comecei a massagear novamente o peito, as laterais. Tocava de leve nas axilas, que se mostravam em seu esplendor, já que ele havia jogados os braços para trás e um cobria os olhos. A garganta secava e minha boca fazia cócegas, ela queria participar. Me curvei novamente e repeti o que havia feito nas costas, passeando com o nariz por apenas alguns segundos antes de começar a lamber o que quer que houvesse ali. Evitando por enquanto os mamilos, fui lambendo e sentindo o gosto de sal e de perfume. Num movimento ousado, lambi em volta das axilas, o que fez com que bruscamente ele recolhesse os braços e vedasse minha passagem por aquela parte tão heterodoxa do seu corpo. “Eu tenho cócegas!”, disse rindo, e percebi pela primeira vez na noite um sorriso autêntico, aquele sorriso pueril do qual eu era fã. Sorri também. Fui me aproximando aos poucos, queria capturar aquele sorriso pra dentro de mim, queria devorá-lo. Não sei se foi meu calor, ou algum pressentimento, mas a cinco centímetros de meus lábios tocarem dele, abriu os olhos e vi o medo se estampar. Ele virou o rosto. “Ow, ow ow... sem beijo! Isso não rola mesmo!” Isso me paralisou. Uma onda de fúria (ou seria vergonha?) subiu ao meu rosto, inflamando-me. “Mas, meu...”, e dessa vez foi ele que me interrompeu. “Acho melhor a gente parar. Não ia dar certo mesmo, e ...” Eu tinha que pará-lo. Tinha que virar o jogo. Pensa rápido, pensa rápido. “Beleza! Eu tava mesmo forçando a barra. Desculpa, de coração, mas não vamos estragar o que tava tão legal. Não tava gostoso até agora?” Desviei o olhar, pois não queria ouvir ou ver nenhuma expressão que pudesse contradizer o que eu estava sentindo. “Faz o seguinte”, continuei, “deixa eu continuar a massagem, pra pelo menos você ficar relaxado. Tira a calça, pra eu poder fazer direito nas panturrilhas.”
Recebi um olhar desconfiado. De novo, pensei que havia me movimentado rápido demais. Mas ele balançou a cabeça, recostando novamente na cama, e levando as mãos até o botão e o zíper. Parecia que se movia em câmera lenta, e eu senti um calor subindo por minhas coxas, alojando-se na virilha. De novo aquela cena parecia tão sublime, quase irreal. Ele desabotoou a calça, e lentamente – o que parecia para mim uma eternidade –, desceu o zíper. Segurando pelas barras, fiz a calça deslizar por suas pernas e a joguei no chão perto de onde havia jogado as meias.
Pude então observar aquelas coxas que antes só se delineavam sob o tecido, e notar o volume que ainda se mantinha oculto sob uns centímetros quadrados de tecido. Ele notou meus olhares e se envergonhou. “Você não vai continuar a massagem?” Saí daquele torpor contemplativo e baixei os olhos para observar os já conhecidos pés e o restante da perna. Resignado, mas ainda contente, ajoelhei-me no chão, fora da cama, e comecei a fazer movimentos nas panturrilhas e na canela. Ali fiquei entretido, fui me perdendo em pensamentos, de novo refletindo sobre a total sensação de irrealidade que aquela situação me provocava. Ele voltou ao seu estado inerte, e eu ficava imaginando o que ele poderia estar pensando naquela hora. Quando já havia me aborrecido de massagear aquela região, decidi ousar e comecei a massagear os joelhos, rapidamente mudando para as coxas. Nenhuma reação.
Foi neste exato momento que tive a ideia: se não pode vencê-los, junte-se a eles. Decidi que não podia atacar diretamente, tentaria de uma forma mais velada. “Posso te fazer uma pergunta?” lancei. “Lá vem!” e a resposta dele já se tornava uma constante. “Como foi sua melhor transa?” Ele ficou em silêncio por alguns segundos resolvendo dar a resposta mais comum. “Foi legal, muito excitante.” E o silêncio. Será que ele achou que uma resposta simples dessa poderia me apaziguar? Percebo que estou apertando-lhe as coxas em movimentos repetitivos e quase mecânicos. “Já que é tudo o que vou conseguir de você, por que não me conta com algum detalhe como foi?” Com qual objetivo as pessoas respeitam as vítimas? Será que Nietzsche não ensinou bem a lição de que a piedade é a miséria que constitui o homem moderno? “Bom”, ele mordia a isca de novo, “foi com minha ex-namorada. Estávamos na praia, o pessoal saiu da casa onde ficamos hospedados, indo pra praia, e nós ficamos pra trás. Só eu e ela. Ela não queria, eu tava já com muito tesão, por ela estar só de biquíni e canga.” Continuei a massagem e esbocei um sorriso que tentei esconder olhando para o outro lado. “Sério?”, soltei, forçando um pretenso interesse nessa história tão alheia a nós, àquele momento. Ele continuava. “Ela dizia que a qualquer momento alguém podia voltar, e eu dizia pra ela que não tinha que se preocupar porque a gente ouviria alguma coisa. Ela não queria ceder e isso foi me deixando com mais tesão. Ela inclusive começou a se afastar de mim e mandar eu me controlar porque ela não ia conseguir se segurar muito.” Enquanto ele contava essa parte da história, eu fui subindo minhas mãos na coxa dele, ainda massageando, consegui fazer as costas da minha mão tocarem o tecido da cueca. Afastei um pouco suas pernas, e com o dedo mindinho podia tocar-lhe levemente o saco, de uma forma bastante disfarçada, como que acidental. E ele continuava, ignorando este meu movimento “Daí eu coloquei ela contra a parede, ela pedia pra eu parar e aquilo ia me deixando mais e mais excitado, fui passeando a mão pelo corpo dela e fui pondo a mão por dentro do biquíni. Ela gemia, não pedia mais pra eu parar, só gemia baixinho que era melhor não, que tava tão gostoso, e eu não conseguia parar... O peito dela inchava na minha boca, o mamilo super duro, e eu ia pressionando ela contra a parede, lambendo a orelha e...” E ele engasgou. Não conseguiu terminar a frase, olhei pra cima e entendi o porquê. Meu plano tinha dado certo. Não sei bem se por causa das minhas carícias pseudo-acidentais ou pelas lembranças que a história devia estar causando nele, o corpo estava reagindo e o pinto dele estava duro, latejando e lutando contra a falta de espaço, pois a cueca mal conseguia contê-lo. Ele percebeu meu olhar e foi como se tivesse levado um choque. Fechou ambas as mãos em forma de concha e colocou sobre seu membro que mal cabia sob essa precária proteção. Era minha hora de agir. Tinha que ser agora. “Ela te chupou?”, como se eu não tivesse percebido nenhum movimento, continuei. “Não. Ela não gostava muito disso não”, disse ele, meio contrariado. Foi uma questão de segundos. Com uma mão, empurrei a proteção que ele havia feito com as mãos para o lado, e com a outra, puxei um pouco a cueca. Ainda estava meio duro, e saltou para fora. Ele tentou empurrar minha cabeça pro lado, mas eu já havia me abaixado e lambia seu pinto de baixo pra cima. Quando cheguei à glande, que estava recoberta pelo prepúcio, fiz pequenos movimentos com a língua, e seu pênis vibrou, endurecendo totalmente. Ao endurecer, ele se elevou um pouco e aproveitei para colocá-lo dentro da boca. Engolindo cada centímetro daquele membro, ia sentindo como se estivesse aplicando alguma espécie de anestesia, pois suas mãos já não mais empurravam a minha cabeça e ele já não mais debatia as pernas numa tentativa de se sentar ou se levantar. Fui aproveitando a velocidade com que tinha feito aquilo – meu coração batendo aceleradamente, meu pinto endurecido, mas preso pela calça, incomodando –, para fazer movimentos mais e mais intensos e velozes. Será que eu o havia matado? Não havia mais sons ou movimentos por parte dele. Apenas um corpo, os olhos fechados e um pinto duro.
Com uma das mãos, eu segurei a base do pênis para que eu pudesse evitar uma posição na qual minha boca pudesse machucá-lo. Com a outra, fui abrindo meus zíper e botão. Finalmente havia atingido o que queria, mas havia algo errado. Eu queria mais. Tirei a boca com cuidado, com medo de fazê-lo despertar daquela catatonia, e com uma mão, mantive o movimento frenético da masturbação, fazendo movimentos repetidos com o dedão e com indicador, aproveitando a lubrificação da minha saliva. Com a outra mão, tentava me livrar da calça e da camiseta. Já não conseguia mais pensar direito, já não conseguia mais jogar.
Estava apostando que havia dado a partida, havia derrubado a primeira peça de um efeito dominó, e que seria impossível para ele voltar dali. Enquanto o masturbava, pude perceber pela primeira vez de verdade o que era aquilo que tinha na mão. Um pinto não muito grande, mas grosso, pelo menos mais grosso que o meu. Bastante rico em veias, mais claro do que esperava, pelo tom de pele dele. Um prepúcio abundante e que revelava apenas a pontinha daquela glande rosada, mas não vermelha brilhante. A quantidade de pelos era abundante e era prosseguimento daqueles que se espalhavam pelo seu abdômen. Enquanto computava estes detalhes antes negligenciados, percebi que ele abriu o olho. Ficou olhando para o teto, um olhar perdido, sem me fitar, quase sem vida.
Consegui me desvencilhar da minha calça e tentava com apenas uma das mãos tirar a camiseta. Pronto! Daí, só de cueca e meia, eu fui me arrastando na cama e em um movimento rápido, colei meu peito ao dele, joguei todo meu peso sobre aquele corpo que foi queimando toda minha pele, assim como tinha feito com minha mão. Ele reagiu tentando se livrar daquele abraço que deveria ser para ele bastante incômodo. Mas me aproveitava do fato de estar por cima e tentava manter o equilíbrio e sentia nossos pênis se roçando e eu começava a mover meus quadris para frente e para trás, tentando mantê-lo excitado, tentando mordiscar-lhe o pescoço. Começava a pensar na história que ele tava contando, de como a ex-namorada dele ficava pedindo pra ele parar e o quanto essa proibição fazia com que ele não conseguisse se controlar. É o que dizem, proibido é mais legal. De repente, de uma forma que chegou a me assustar, ele soltou como uma espécie de suspiro e protesto: “Meu, o que você tá fazendo? Para com isso!” Eu não conseguia ter energia para parar, o cheiro do cabelo dele, que esbarrava no meu nariz e boca não me deixava falar. Além, certamente, do esforço que eu estava tendo que fazer pra me manter naquela posição. Só consegui sussurrar entrecortadamente “Não pensa em nada. Atira primeiro e pergunta depois.” Achei uma frase extremamente clichê. Burra. Eu deveria usar outro argumento se quisesse fazer ele prosseguir naquilo. Ainda havia apenas a resistência. E uma resistência deliciosamente pornográfica. Contudo, sabia que a situação precisava se inverter. Ele não suportaria mais estar numa posição de subjugado. Seu adestramento havia sido aquele no qual ele é o grande provedor, o que faz os movimentos, o que leva na dança. Mas sem a motivação, como poderia fazer para que ele fizesse os movimentos? Ele conseguiu agarrar meu pulso com uma das mãos que havia se libertado do meu abraço e começou a empurrar. Tentava usar toda a ajuda que a gravidade poderia me dar e tentava me colar à cama e percebi que o esforço que ele estava fazendo me lembrava do que uma vez alguém me dissera: “Com uma mulher é como manipular uma flor. Transar com um homem se assemelha a uma luta.” Fui deixando ele me ganhar, fui me amolecendo. Achava que já tinha chegado ao ápice do que a fortuna poderia me trazer. Mas daí, com que se soprado ao meu ouvido ouvi uma vozinha: “Percebe que pinto dele está duro ainda?”
Imagens invadiam minha mente. A casa da praia, um lugar onde eu não havia estado, ele e uma menina (sem rosto, pois eu jamais a havia visto), ambos encostados em uma parede. Eu podia até sentir o frio dos tijolos, e o desejo dele aumentando. A luta fazia as coisas ficarem mais quentes. Assim, ainda que houvesse a resistência – e talvez tudo fosse abortado, no momento em que eu parasse de me movimentar –, havia essa contra-força, que criava uma situação inusitada em tons extremamente eróticos. Até que ponto eu precisava ir para conseguir envolvê-lo em uma rede, em uma arapuca, para que a inércia funcionasse e ele continuasse aquela dança de movimentos improvisados e dolorosos? Meus músculos tensionavam, minha resistência estava chegando ao limite. Pingos de suor desciam pela minha testa e nariz. Meus braços já começavam a ficar dormentes, contudo, o cheiro que emanava dele e o calor, que aumentava mais e mais com seus movimentos não permitiam que eu esquecesse onde estava.
Seus esforços para se livrar do meu abraço também diminuíam a cada tentativa frustrada, mas ele percebia que minhas forças estavam se esgotando. Que era apenas uma questão de tempo.
Finalmente, decidi que aquela luta não ia levar a nada. Me joguei para o lado, arfando e sentindo cada poro do meu corpo transpirar. Sentia o lençol grudando na minha pele, mas não conseguia me mover. Olhando de esguelha para o lado, percebia que ele também não conseguia se mover. Com o pinto mole já, também respirava fundo e tentava recuperar suas forças. Eu observava aquele corpo e já lamentava que as coisas tivessem que acabar daquela forma. Reunindo algumas forças, soltei: “Foi uma luta e tanto. Pena que você não consegue ir além.”
Ele abriu os olhos e olhou diretamente para mim. Aquele não era o olhar que eu conhecia. Não havia nenhum traço de marotice, apenas violência e... luxúria?! De repente tudo acontecia rápido demais, meus sentidos eram confundidos pela velocidade das ações e pela improbabilidade de aquilo estar acontecendo. Agarrou meu braço e puxou meu corpo para junto dele, com a outra mão empurrando minha cabeça para baixo. Encostei meus lábios em sua glande e comecei a fazer movimentos com a língua, e logo já estava novamente com a boca cheia de algo pulsante e vibrante. Enquanto fazia movimentos rápidos e famintos, ele esticou o corpo para fora da cama e parecia procurar por algo. Ouvi o barulho tão conhecido de plástico sendo rasgado, e o cheiro de látex invadido o ambiente. Olhei e reconheci o que ele segurava com as pontas dos dedos enquanto olhava para mim, firme e imperativo. Parei de fazer o vai-e-vem e, seguro que se tratava de um blefe, dei licença para que ele pudesse colocar a camisinha. Fiz movimentos de que eu poderia fazer aquilo para ele, mas fui rechaçado de novo com um olhar.. O que o fez mudar de ideia? Aquilo não estava nos meus planos.
Não acreditava no que aquilo significava. Colocar a camisinha era o mesmo que assinar o contrato, entrar deliberada e finalmente no jogo.
De novo, sentia que seu olhar mudara, e a malícia me assustava ao mesmo tempo em que me excitava. Peguei minha mochila, que estava jogada num canto, e trouxe ao cenário um tubo de lubrificante. Entreguei a ele e deitei-me de bruços. Agora eu tinha perdido o controle, era ele quem decidia o que ia fazer. Espalhou o lubrificante sobre a palma da mão, e após molhar os dedos da outra afastou as minhas nádegas, num movimento de alguém que parecia muito senhor de si, ainda que hesitante em procurar o que sabia que encontraria. A frieza do gel se mesclou ao toque quente, dedos perscrutadores massageando e lubrificando. Num salto, aquela vivacidade na sequência de tamanha imobilidade me assustava, ele estava sobre meu corpo nu e fui sentindo seu peso e sua dureza que ia buscando se encaixando em mim. Pensei em me ajeitar para poder estar apto a receber aquilo que ao mesmo tempo me preocupava e me excitava. Nunca imaginei que ele fosse me penetrar, não sei se era exatamente o que eu queria. Senti que a glande já me invadia. Respirei fundo, e tentei relaxar, para diminuir a dor. Soltei um “Vai devagar!”, mas ele parecia não ter ouvido, ou simplesmente escolheu ignorar. Sentiu também que havia entrado e num único movimento, pungente, colocou tudo. A dor se mesclava com a irrealidade, transformando aquilo num pesadelo do qual eu não sentia a menor vontade de acordar. Gemi, e tentei me adaptar àquele volume todo. Antes de qualquer sucesso de minha parte em relaxar, aquele corpo estranho começou a fazer movimentos, mas outra vez, apesar de meu desejo que ele fosse lentamente me possuindo, ele rapidamente acelerava seus movimentos. A dor ia se tornando insuportável.
Sentia lágrimas saindo dos meus olhos, mas ainda assim, não conseguia reunir forças pra pedir que parasse. Sentia que às vezes ele reduzia o ritmo, como se estivesse se contendo, mas depois de alguns segundos retomava seu frenesi. Esses ciclos iam se repetindo, eu sentia o suor escorrendo, e via que já se formava uma poça na cama onde estávamos. De repente, estremeço com a voz dele sussurrada: “Tá gostando, tá?” Por que ele tinha que falar desse jeito? Minha garganta parecia ter dado um nó. Não era só tesão? Não conseguia respirar direito. Seu peso me oprimia. Ele estava sorrindo? Não conseguia me virar para ver o rosto dele, pra investigar seu olhar. Me senti sozinho. Um figurante na minha própria história.
Súbito, ouço ele gemer e seu corpo desaba sobre o meu. Vou sentindo espasmos fortes, seu pênis latejando dentro de mim e a sensação de paz que aquela parada me provocou. Alívio puro. Começo a me perceber, recupero a consciência e percebo que ondas de prazer e surpresa me invadem, ao passo que me excito na hora e virando um pouco de lado, ainda com ele dentro de mim, de volta à sua imobilidade, mecanicamente me manipulo pra que um jato quente me traga paz e libertação.
Sinto que ele respira fundo nas minhas costas. Me afasto de seu corpo e rapidamente me viro. Olho nos olhos dele, mas já não consigo lê-los. Parece que vejo neles uma certa compaixão, um certo escárnio, talvez vergonha, uma expressão indefinida. Desvio o olhar. Quem é ele? Quem sou eu? Só sinto uma estranheza que nem tento explicar. E uma ponta de... orgulho? Talvez. Levanto-me e vou ao banheiro. Ele continua parado na cama, uma estátua. Ligo o chuveiro e deixo o jato frio tentar me explicar o que aconteceu.
domingo, 18 de abril de 2010
Renúncias - Mir, OK
Originalmente publicado em 4 de fevereiro de 2008.
ATENÇÃO - este post possui conteúdo erótico. Antes de lê-lo, recomendo que leia o Introito
Hoje ele me olhou de uma forma diferente. Como de costume todos foram embora e nós ficamos conversando sobre nossa semana, sobre tudo, e ele estava tão sorridente quanto sempre. Ele se levantou para pegar alguma coisa na mochila dele, que estava na cadeira da secretaria, e eu continuei sentado na cadeira da mesa redonda da sala de computadores, onde costumávamos ficar conversando. Continuei contando coisas sobre a semana, como ela tinha sido estressante, e senti que ele voltava pra sala onde eu estava.
Ao invés de se sentar de novo, ele parou atrás de mim e colocou as mãos nos meus ombros. Eu emudeci. Ele apertou cada ombro levemente e aquele toque, depois de tanto tempo, fez-me relaxar mesmo. Olhei pra trás, sobre os ombros, e ele tirou as mãos e recuou uns passos. Eu disse: “Começou, vai ter que ir até o fim!” E ele deu aquele sorriso maroto dele, daqueles de derreter a gente. “Deixa pra lá, vai.”, ele disse. Ao que eu retruquei “Desculpa por ter insistido. Foi um momento gostoso.” E ele se sentou. Eu ainda sentia o calor do aperto dele nos meus ombros e decidi me levantar para ver se aquele peso saía de lá. Ele tinha ficado envergonhado do que fizera. E eu achei que talvez fosse melhor mostrar pra ele que não tinha sido ruim. Parei atrás dele e fiz o mesmo gesto. Porém percebi que diferente de mim que relaxei, a tensão dele parecia aumentar. “É melhor não...” ele disse meio baixinho, mas eu continuei apertando os ombros dele. “Ta tão ruim assim?” eu perguntei, e ele ia se soltando e disse “Não, mas é melhor a gente parar senão você fica pensando coisas...” e riu. Eu abaixei, sem tirar as mãos de seus ombros, apertando-os ainda levemente. E sussurrei em seu ouvido: “Fica calmo, eu não vou além de onde você deixar. Fecha os olhos e sente meu toque como se fosse o toque da pessoa que mais te deseja no mundo, o toque de alguém que já se foi, ou de alguém que você anseia que ainda virá. Sinta o toque cheio de ternura, ainda que tingido de desejo. O toque de alguém que te admira, ainda que saiba que você é um dos inatingíveis...” Ele ficou em silêncio. Até eu tinha me assustado com essas palavras, de onde tinha vindo tudo aquilo? Ao dizer essas coisas tão perto dele, percebi que conseguia sentir o cheiro que emanava da sua pele, o calor do pescoço descoberto. Minhas mãos continuavam em movimentos contínuos em seus ombros, mas eu tentava dar conta de uma região maior e aumentava o círculo a cada apertada que agora se confundia com afagos. Continuei naquela posição, com a boca perto de sua orelha, só conseguindo ficar curvado, sem dizer nada. Vi que ele mantinha os olhos fechados, como eu havia pedido. Comecei a aproximar meu rosto do pescoço dele e encostei a ponta do nariz na sua nuca. Comecei a passear com o nariz naquele pescoço e percebi que ele estava sobressaltado. “Quer que eu pare?” disse quase num suspiro, mas ele parecia em transe. Ele deveria ter percebido no meu tom de voz uma súplica de que queria continuar. Nesse ponto, já havia transformado os apertos em afagos que tomavam toda a região das omoplatas e na frente chegavam perto dos mamilos. Foi exatamente neles que eu parei os afagos e comecei a sentir um e outro, por cima da camiseta. Saia também do pescoço e expandia meu toque nasal pelo seu rosto áspero de barba, mas muito cheiroso. Ele abriu os olhos assustado, no momento em que meu nariz tocava seus lábios, e começou: “Meu, é melhor...”, mas ele foi interrompido no momento em meus lábios se colavam aos dele. Ele se sentiu bastante desconfortável. Seu corpo todo retesou na cadeira, e achei que ele fosse me repelir, mas senti sua língua quente penetrando na minha boca, explorando timidamente, como se ele quisesse se livrar logo daquilo ainda que pelo sim e não pelo não.
Percebi que inconscientemente tinha saído da minha posição curvado atrás dele e havia o contornado, parando do seu lado. E aquele beijo que continuava, e minhas mãos sentindo cada centímetro possível de seu torso, buscando alcançar a barra de sua camiseta. Assim que senti sua pele queimar minha mão, outro sobressalto. Sua pele, nem lisinha, nem peluda, um misto dos dois, um meio do caminho, onde o que havia sido aparado tornava a crescer, foi me levando até o umbigo tocando tudo levemente com as pontas dos dedos, como se tivesse medo de quebrar. Ele parou o beijo e sorriu desconcertado. Achei que tinha ido longe demais e ouvi ele dizer “Pronto, né? Tá feliz agora?” Eu olhei pra ele, bem no fundo dos olhos, e não ousei abrir a boca, mas era evidente que eu queria mais. Ele mexeu os braços que até aquele momento pareciam mortos e paralelos ao corpo, tão diferente dos meus tentáculos impacientes. Ele me empurrou levemente e levantou. Parecia que tinha sido bom enquanto havia durado aquele momento todo, mas ao invés disso ele me pegou pelo braço e sem olhar mais nos meus olhos, sem dizer sequer uma palavra, foi me conduzindo até a sala de TV. Ele encostou-se à parede e falou “Eu devo estar louco” e me puxou pra junto dele. Eu comecei a queimar de excitação, e agora como alguém que já conhece o caminho, fui levando minha mão pra dentro da camiseta dele, levantando-a ao máximo e sentindo cada centímetro de pele. Minha cabeça rodava e eu não sentia mais nenhuma resistência por parte dele. Seus beijos, cheios de desejo, mas com uma pitada de culpa me faziam querer mais e mais que aquele momento durasse eternamente.
Sentia que como eu, ele também estava excitado, mas tinha medo de querer demais e estragar aquele momento, trazendo ele de volta à realidade. Mas não conseguia deixar de ousar já que a cabeça de cima já não era quem determinava o processo. Fui explorando e pus a mão onde sentia o pulsar daquele membro que havia acabado de dar sinal de vida. E como o esperado, outro sobressalto. Tirei a mão, sem interromper o beijo e senti a mão dele pegando minha mão e reconduzindo até onde ela tinha estado.
Ainda assim, não satisfeito e dono de uma vontade estranha de não me contentar com o que as roupas omitem, decidi, novamente num movimento ousado, depois de apenas alguns segundos, abaixar seu zíper. No momento em que comecei, não houve sobressalto, mas ele parou. Gelei e pensei: “ferrei tudo.” Ele me olhou sério e falou “Pô, isso não! Já não tá bom assim?” Quem tinha ficado desconcertado era eu, olhei pra ele e num tom misto de criança mimada e general do exército, exigi “Deixa só eu vê-lo!?” Ele ponderou por alguns segundos e, resignado, como se fosse sua única opção, ele mesmo abriu a calça e terminou de baixar o zíper. Ainda na cueca, mas por estar duro, não conseguindo ser contido por ela, então escapando por cima, lá estava ele. “Pronto?” ele perguntou impacientemente. Eu tremi e minhas pernas amoleceram. Senti que precisava ver aquilo de perto e cai de joelhos. Senti que era minha obrigação livrá-lo daquela situação desconfortável e puxei a cueca, e eis um belo membro, apontando pro lado, tortinho, durinho, fino e não tão comprido, pontudo, com os pêlos aparados, quase nu. Fui me aproximando mais e abrindo a boca, sentindo o cheiro exótico de urina, suor e um pouco da babinha que escorria pela glande.
Ele segurou minha cabeça com uma das mãos. Eu olhei pra cima o fuzilando e não encontrei o sorriso de sempre. Ele estava bravo: “Por que não ir além se eu já cheguei tão longe?” “Porque não, oras! Não sou igual a você” respondeu ele, rispidamente. “Me conceda o benefício da dúvida. Alguns segundos e se você não gostar eu paro na hora.” disse em tom de desafio e presunção. Ele balançou a cabeça negativamente, mas ele bobeou e se distraiu. Aproveitei a oportunidade quando a resistência dele tinha diminuído e, num movimento rápido, abocanhei aquele pinto que já estava meia-bomba. Como esperado senti um sobressalto e um “Não!” que havia começado enfático e morria quase que num gemido. Não há modo de reagir mal à invasão de algo macio e quente. Minha excitação tinha chegado a tal ponto que eu parecia estar febril. E quanto mais os movimentos se tornavam constantes e abrangentes, engolindo cada milímetro a mais que na vez anterior, menor se tornava sua resistência. Eu tenho que admitir que sou bom nisso, e me esmerava pra fazer cada vez melhor e mais prazeroso. Sem me distrair do vai-e-vem, olhei pra cima com o rabo dos olhos e percebi que em seu rosto se imprimia uma luta interna: ele sentia-se mal por estar ali, certa culpa, mas sua expressão tingia-se de prazer, de desejo. Nesse momento, eu não podia fazer nenhum movimento errado, senão eu quebraria o delicado equilíbrio, e uma raspada de dente significaria acordá-lo do transe e acabar com tudo. Decidi parar os movimentos e ousar com malabarismos com a língua. Passava ela por toda a extensão do pinto, com movimentos circulares na glande. Os meus joelhos doíam e eu percebia que a posição estava desconfortável para ele também, que se apoiava precariamente na parede ainda, mas não podia fazer nenhum movimento brusco, e aguentei firme. Desci a língua até o saco, um lugar até então pouco explorado e percebi que ele não tinha muitas experiências com estimulações ali por causa da reação que teve. Normalmente, não é um lugar que as mulheres buscam explorar. Enquanto minha língua passeava livremente, mas rápida, minha mão cuidava para que nada fosse deixado de lado e eu o masturbava calmamente e até cheguei a mordiscar suas coxas. Sua mão, que havia me segurado antes, havia se fechado em um chumaço de cabelos ao qual ele se agarrava conduzindo-me para onde eu o estimulara melhor. Decidi voltar a chupá-lo enquanto beliscava levemente seu saco. Fui aumentando a intensidade e o masturbando com uma das mãos ele falou “vou gozar”, mas isso não fez com que eu parasse, e sim intensificasse os movimentos.
Quando senti os espasmos, tirei a boca e encostei a glande na minha bochecha. Senti o líquido quente vertendo em jatos curtos e escorrendo pela minha bochecha e queixo. Ele se arqueava e fiquei com medo que ele fosse cair. Levantei e sorri pra ele. Vi que ele estava muito envergonhado. Fui até o banheiro e lavei o rosto. Peguei um pouco de papel para secar as gotas que haviam sujado o chão e quando voltei, ele já não estava mais lá. Estava na secretaria, de mochila nas costas. “Vamos?” ele disse, como se nada tivesse acontecido. Eu olhei pra ele. Ele desviou o olhar. Me aproximei para dar um abraço. Sei que o que tinha acontecido ia ser bem difícil pra ele digerir. Ele percebeu meu movimento e estendeu a mão. Fiquei imóvel por alguns segundos. Suspirei e apertei a mão dele. “Até sábado que vem e não se esquece de fazer as tarefas.”
ATENÇÃO - este post possui conteúdo erótico. Antes de lê-lo, recomendo que leia o Introito
Hoje ele me olhou de uma forma diferente. Como de costume todos foram embora e nós ficamos conversando sobre nossa semana, sobre tudo, e ele estava tão sorridente quanto sempre. Ele se levantou para pegar alguma coisa na mochila dele, que estava na cadeira da secretaria, e eu continuei sentado na cadeira da mesa redonda da sala de computadores, onde costumávamos ficar conversando. Continuei contando coisas sobre a semana, como ela tinha sido estressante, e senti que ele voltava pra sala onde eu estava.
Ao invés de se sentar de novo, ele parou atrás de mim e colocou as mãos nos meus ombros. Eu emudeci. Ele apertou cada ombro levemente e aquele toque, depois de tanto tempo, fez-me relaxar mesmo. Olhei pra trás, sobre os ombros, e ele tirou as mãos e recuou uns passos. Eu disse: “Começou, vai ter que ir até o fim!” E ele deu aquele sorriso maroto dele, daqueles de derreter a gente. “Deixa pra lá, vai.”, ele disse. Ao que eu retruquei “Desculpa por ter insistido. Foi um momento gostoso.” E ele se sentou. Eu ainda sentia o calor do aperto dele nos meus ombros e decidi me levantar para ver se aquele peso saía de lá. Ele tinha ficado envergonhado do que fizera. E eu achei que talvez fosse melhor mostrar pra ele que não tinha sido ruim. Parei atrás dele e fiz o mesmo gesto. Porém percebi que diferente de mim que relaxei, a tensão dele parecia aumentar. “É melhor não...” ele disse meio baixinho, mas eu continuei apertando os ombros dele. “Ta tão ruim assim?” eu perguntei, e ele ia se soltando e disse “Não, mas é melhor a gente parar senão você fica pensando coisas...” e riu. Eu abaixei, sem tirar as mãos de seus ombros, apertando-os ainda levemente. E sussurrei em seu ouvido: “Fica calmo, eu não vou além de onde você deixar. Fecha os olhos e sente meu toque como se fosse o toque da pessoa que mais te deseja no mundo, o toque de alguém que já se foi, ou de alguém que você anseia que ainda virá. Sinta o toque cheio de ternura, ainda que tingido de desejo. O toque de alguém que te admira, ainda que saiba que você é um dos inatingíveis...” Ele ficou em silêncio. Até eu tinha me assustado com essas palavras, de onde tinha vindo tudo aquilo? Ao dizer essas coisas tão perto dele, percebi que conseguia sentir o cheiro que emanava da sua pele, o calor do pescoço descoberto. Minhas mãos continuavam em movimentos contínuos em seus ombros, mas eu tentava dar conta de uma região maior e aumentava o círculo a cada apertada que agora se confundia com afagos. Continuei naquela posição, com a boca perto de sua orelha, só conseguindo ficar curvado, sem dizer nada. Vi que ele mantinha os olhos fechados, como eu havia pedido. Comecei a aproximar meu rosto do pescoço dele e encostei a ponta do nariz na sua nuca. Comecei a passear com o nariz naquele pescoço e percebi que ele estava sobressaltado. “Quer que eu pare?” disse quase num suspiro, mas ele parecia em transe. Ele deveria ter percebido no meu tom de voz uma súplica de que queria continuar. Nesse ponto, já havia transformado os apertos em afagos que tomavam toda a região das omoplatas e na frente chegavam perto dos mamilos. Foi exatamente neles que eu parei os afagos e comecei a sentir um e outro, por cima da camiseta. Saia também do pescoço e expandia meu toque nasal pelo seu rosto áspero de barba, mas muito cheiroso. Ele abriu os olhos assustado, no momento em que meu nariz tocava seus lábios, e começou: “Meu, é melhor...”, mas ele foi interrompido no momento em meus lábios se colavam aos dele. Ele se sentiu bastante desconfortável. Seu corpo todo retesou na cadeira, e achei que ele fosse me repelir, mas senti sua língua quente penetrando na minha boca, explorando timidamente, como se ele quisesse se livrar logo daquilo ainda que pelo sim e não pelo não.
Percebi que inconscientemente tinha saído da minha posição curvado atrás dele e havia o contornado, parando do seu lado. E aquele beijo que continuava, e minhas mãos sentindo cada centímetro possível de seu torso, buscando alcançar a barra de sua camiseta. Assim que senti sua pele queimar minha mão, outro sobressalto. Sua pele, nem lisinha, nem peluda, um misto dos dois, um meio do caminho, onde o que havia sido aparado tornava a crescer, foi me levando até o umbigo tocando tudo levemente com as pontas dos dedos, como se tivesse medo de quebrar. Ele parou o beijo e sorriu desconcertado. Achei que tinha ido longe demais e ouvi ele dizer “Pronto, né? Tá feliz agora?” Eu olhei pra ele, bem no fundo dos olhos, e não ousei abrir a boca, mas era evidente que eu queria mais. Ele mexeu os braços que até aquele momento pareciam mortos e paralelos ao corpo, tão diferente dos meus tentáculos impacientes. Ele me empurrou levemente e levantou. Parecia que tinha sido bom enquanto havia durado aquele momento todo, mas ao invés disso ele me pegou pelo braço e sem olhar mais nos meus olhos, sem dizer sequer uma palavra, foi me conduzindo até a sala de TV. Ele encostou-se à parede e falou “Eu devo estar louco” e me puxou pra junto dele. Eu comecei a queimar de excitação, e agora como alguém que já conhece o caminho, fui levando minha mão pra dentro da camiseta dele, levantando-a ao máximo e sentindo cada centímetro de pele. Minha cabeça rodava e eu não sentia mais nenhuma resistência por parte dele. Seus beijos, cheios de desejo, mas com uma pitada de culpa me faziam querer mais e mais que aquele momento durasse eternamente.
Sentia que como eu, ele também estava excitado, mas tinha medo de querer demais e estragar aquele momento, trazendo ele de volta à realidade. Mas não conseguia deixar de ousar já que a cabeça de cima já não era quem determinava o processo. Fui explorando e pus a mão onde sentia o pulsar daquele membro que havia acabado de dar sinal de vida. E como o esperado, outro sobressalto. Tirei a mão, sem interromper o beijo e senti a mão dele pegando minha mão e reconduzindo até onde ela tinha estado.
Ainda assim, não satisfeito e dono de uma vontade estranha de não me contentar com o que as roupas omitem, decidi, novamente num movimento ousado, depois de apenas alguns segundos, abaixar seu zíper. No momento em que comecei, não houve sobressalto, mas ele parou. Gelei e pensei: “ferrei tudo.” Ele me olhou sério e falou “Pô, isso não! Já não tá bom assim?” Quem tinha ficado desconcertado era eu, olhei pra ele e num tom misto de criança mimada e general do exército, exigi “Deixa só eu vê-lo!?” Ele ponderou por alguns segundos e, resignado, como se fosse sua única opção, ele mesmo abriu a calça e terminou de baixar o zíper. Ainda na cueca, mas por estar duro, não conseguindo ser contido por ela, então escapando por cima, lá estava ele. “Pronto?” ele perguntou impacientemente. Eu tremi e minhas pernas amoleceram. Senti que precisava ver aquilo de perto e cai de joelhos. Senti que era minha obrigação livrá-lo daquela situação desconfortável e puxei a cueca, e eis um belo membro, apontando pro lado, tortinho, durinho, fino e não tão comprido, pontudo, com os pêlos aparados, quase nu. Fui me aproximando mais e abrindo a boca, sentindo o cheiro exótico de urina, suor e um pouco da babinha que escorria pela glande.
Ele segurou minha cabeça com uma das mãos. Eu olhei pra cima o fuzilando e não encontrei o sorriso de sempre. Ele estava bravo: “Por que não ir além se eu já cheguei tão longe?” “Porque não, oras! Não sou igual a você” respondeu ele, rispidamente. “Me conceda o benefício da dúvida. Alguns segundos e se você não gostar eu paro na hora.” disse em tom de desafio e presunção. Ele balançou a cabeça negativamente, mas ele bobeou e se distraiu. Aproveitei a oportunidade quando a resistência dele tinha diminuído e, num movimento rápido, abocanhei aquele pinto que já estava meia-bomba. Como esperado senti um sobressalto e um “Não!” que havia começado enfático e morria quase que num gemido. Não há modo de reagir mal à invasão de algo macio e quente. Minha excitação tinha chegado a tal ponto que eu parecia estar febril. E quanto mais os movimentos se tornavam constantes e abrangentes, engolindo cada milímetro a mais que na vez anterior, menor se tornava sua resistência. Eu tenho que admitir que sou bom nisso, e me esmerava pra fazer cada vez melhor e mais prazeroso. Sem me distrair do vai-e-vem, olhei pra cima com o rabo dos olhos e percebi que em seu rosto se imprimia uma luta interna: ele sentia-se mal por estar ali, certa culpa, mas sua expressão tingia-se de prazer, de desejo. Nesse momento, eu não podia fazer nenhum movimento errado, senão eu quebraria o delicado equilíbrio, e uma raspada de dente significaria acordá-lo do transe e acabar com tudo. Decidi parar os movimentos e ousar com malabarismos com a língua. Passava ela por toda a extensão do pinto, com movimentos circulares na glande. Os meus joelhos doíam e eu percebia que a posição estava desconfortável para ele também, que se apoiava precariamente na parede ainda, mas não podia fazer nenhum movimento brusco, e aguentei firme. Desci a língua até o saco, um lugar até então pouco explorado e percebi que ele não tinha muitas experiências com estimulações ali por causa da reação que teve. Normalmente, não é um lugar que as mulheres buscam explorar. Enquanto minha língua passeava livremente, mas rápida, minha mão cuidava para que nada fosse deixado de lado e eu o masturbava calmamente e até cheguei a mordiscar suas coxas. Sua mão, que havia me segurado antes, havia se fechado em um chumaço de cabelos ao qual ele se agarrava conduzindo-me para onde eu o estimulara melhor. Decidi voltar a chupá-lo enquanto beliscava levemente seu saco. Fui aumentando a intensidade e o masturbando com uma das mãos ele falou “vou gozar”, mas isso não fez com que eu parasse, e sim intensificasse os movimentos.
Quando senti os espasmos, tirei a boca e encostei a glande na minha bochecha. Senti o líquido quente vertendo em jatos curtos e escorrendo pela minha bochecha e queixo. Ele se arqueava e fiquei com medo que ele fosse cair. Levantei e sorri pra ele. Vi que ele estava muito envergonhado. Fui até o banheiro e lavei o rosto. Peguei um pouco de papel para secar as gotas que haviam sujado o chão e quando voltei, ele já não estava mais lá. Estava na secretaria, de mochila nas costas. “Vamos?” ele disse, como se nada tivesse acontecido. Eu olhei pra ele. Ele desviou o olhar. Me aproximei para dar um abraço. Sei que o que tinha acontecido ia ser bem difícil pra ele digerir. Ele percebeu meu movimento e estendeu a mão. Fiquei imóvel por alguns segundos. Suspirei e apertei a mão dele. “Até sábado que vem e não se esquece de fazer as tarefas.”
terça-feira, 13 de abril de 2010
Renúncias - Rafael
primeiramente publicado em 03-08-2008
ATENÇÃO - este post possui conteúdo erótico. Antes de lê-lo, recomendo que leia o Introito
Provavelmente hoje seria mais um dia de aula como qualquer outro. Como de costume, ele chegaria atrasado e eu teria que lhe infringir algum castigo, de modo que ele aprendesse a chegar na hora. Isso já havia sido conversado entre a gente. Ele disse que tudo bem se eu quisesse inventar algum castigo porque ele faria e tudo bem. Mas como lidar com essa possibilidade de poder exercitar poder indistintamente, e a ainda manter o bom-senso de não dar vazão aos meus instintos?
De qualquer forma, eu deveria manter um certo distanciamento, exigindo alguma bobagem e fixando-me naquilo que realmente importava. O castigo era mais que uma punição para ele, era para mim uma chance de quebrar com as convenções e sofrer as conseqüências internas e externas disso: eu morria de medo de pedir algo que pudesse desestabilizá-lo, e mostrar que além de eu ter poder sobre ele, o que estava implícito na minha possibilidade de exigir o pagamento de um castigo, era o poder que ele exercia sobre mim.
Será que ele notava que era existente ou genuíno meu desejo? Pelas suas pernas, pelo seu torso, pela sua boca? Que eu sentia falta da sua imagem e do seu toque quente, quando eventualmente nossas peles se tocavam num reles aperto de mão? Sua juventude esbelta e despreocupada, sua sexualidade pungente e saltitante, seu medo daquilo que desconhecia, mas que era tão apelativo. Meu medo.
"Hi teacher! Sorry I am late". Quase vinte minutos de atraso. Eu olhei para ele de forma que seu rubor já mostrava que só pelo meu jeito de olhar, provavelmente eu aparentava estar bastante aborrecido. "What can I do? I have to give you a punishment for every five minutes, as we agreed."Mas por que hoje? Logo hoje que eu estava tão excitável, tão sensível na minha carência física e sentimental? Tão no cio, pra ser sincero. Todos aqueles pensamentos de momentos antes da sua chegada foram se mesclando com a visão dele ali tão perto, ao alcance dos braços e demorou alguns segundo para que eu conseguisse exteriorizar: "Take your shoes and socks off." Bom, de certa forma, conseguiria enganar meu desejo, ao poder ter acesso a algo que não podia ter em situações normais. Veria o pé dele e isso seria o bastante para deslocar o desejo para uma outra situação e, assim, poderia me enganar que havia sido satisfeito.
"That’s punishment number one." E ele rapidamente tirou as meias e os tênis. Havia mais três possibilidades de exigir certas coisas, porém não poderia pedir mais nenhum tipo de desnudamento, pois isso poderia conscientizá-lo do que eu queria de fato, e ainda não tinha elementos o suficiente para ter certeza que ele aceitaria jogar o meu jogo.
Pensando melhor eu até podia pedir sim um tipo de desnudamento que me fosse interessante ainda que não fosse um desnudamento em si. E tentei: "Put on your shirt inside out." Ele me olhou, como se não tivesse entendido o que eu havia pedido. Mostrei a parte de dentro da minha camiseta e fiz um sinal com a mão para que ele entendesse. Ele balançou a cabeça, fez um barulho com a língua, uma espécie de estralo e começou a tirar a camiseta. Eu teria apenas alguns segundos, entretanto pude mesmo observar atentamente aquele abdômen retinho, aquela pele branca e lisa. Até mesmo nas axilas ele parecia ter só alguns poucos pelos. Queria poder estender a mão e tocar naquela alvura, mas isso estava fora de cogitação. Ele terminou de ajeitar a blusa e sentou-se. Seria extremamente engraçado, para não dizer trágico se alguém entrasse naquele momento e visse aquilo: um menino com cabelo moicano, piercing, descalço, com a camiseta do avesso. Mas eu queria arriscar. Meu desejo crescia a cada segundo.
Não! Eu tinha que lutar contra ele. Tinha que perceber que aquela não era a hora nem o lugar. Que qualquer um podia entrar, apesar de que nas muitas aulas que eu já dera pra ele, ninguém tinha aparecido.
Tentei me sabotar. Gastando os castigos com bobagens, depois só teria que se ver só comigo na hora de castigar minha fraqueza, na hora de me arrepender.
“You are going to stand on the chair. Open your arms and then stretch them upwards. Ten seconds.”
A passividade silente e obediente me excitava de uma forma que eu nunca havia experimentado antes. Sentia o poder não em termos de força, mas em termos de permissão. Ele me permitia ir além do que eu ousaria, do que essa merda de sociedade aceitaria. Ele estava me deixando com raiva de que tudo não pudesse ser fácil assim. Mas, isso eram apenas migalhas.
Ele subiu na cadeira e esticou os braços em direção ao teto. Ao fazer isso, comecei a contar “One, Two...” Observava que a camiseta dele subia um pouco e deixava a mostra seu umbigo, e o caminho de pêlos clarinhos que subia desde o elástico de sua cueca. “Three... Four...” Sua calça, como dita a moda caindo, quase deixando a mostra toda aquela cueca azul. Não podia afirmar que estava olhando para um grande volume, mas vislumbrava as marcas dele ali. “Five... Six” Decido esticar a mão e tocar aquela carne, mas como não o assustar? Vou me restringir ao caminho de pêlos. “Seven... Eight...” Encosto de leve meu dedo no seu umbigo, movimento este que chama a atenção dele, que olha pra baixo e já meio desce os braços, como numa tentativa de se proteger. Ele não tinha se percebido tão vulnerável. Desci o dedo do umbigo, bem de leve, quase que não o tocando até o elástico da cueca, e sem tocá-la, tirei o dedo e recolhi o braço e me ouvi dizendo: “Nine... Ten”.
Ele desceu da cadeira e me olhava fixamente. Um olhar curioso, mas ao mesmo tempo, diferente daquele de quando ele havia subido.
“Last one, please” ele disse e abriu seu sorriso.
Então, seria só coisa da minha cabeça ou ele tinha de fato percebido o que eu queria? Era agora ou nunca. Deveria eu tentar uma abordagem direta ou uma forma velada de pedido?
“I want you to show me your dick. Hard.”
Ele pareceu não entender e me encarou por alguns segundos. Daí, ele apontou para a cueca e fez uma cara de surpresa. “Você quer ver...” e ficou calado. Respondi em inglês “Yes. Now.” A surpresa dele deu lugar ao que parecia ser aborrecimento. “Não.” Eu decidi partir pro ataque. “Nunca disse que a punição deveria ser fácil. Você tem medo ou vergonha de mostrar o que tem?”
Ele fechou a cara. Achei que ele fosse sair da sala, me expor. Ele baixou a cabeça e colocou a mão na cueca.
Percebi que ele, sem colocar pra fora, começava a lentamente apertar e manipular e acordar o que estava adormecido. Ele não olhava pra mim e parecia querer fazer aquilo o mais rápido possível, pra que pudesse se livrar da situação. The only way out is through, como diria a Alanis. Eu me dirigi até a porta e me encostei contra ela. Ele continuava focado em si e nos movimentos que estava fazendo. Via a mão dele subindo e descendo por dentro da sua calça e ele olhou pra mim. Não consegui ler este olhar rápido. “Tá ruim?” eu perguntei. Ele não respondeu. Com a outra mão livre, ele desceu a calça e a cueca, de uma forma a revelar seu pinto já ereto, maior do que eu supunha ser, mas não grande. Olhei para a porta. Não havia trava, mas queria poder ver de mais perto. Desencostei e fui me aproximando dele. Ao ver que eu me aproximava, ele voltou a puxar a cueca e eu disse “Eu não estava enxergando direito ali de longe. Prometo que não vou pôr a mão. Deixa só eu ver de perto, por favor”
Ele lançou um olhar meio suspeito para mim, depois para porta e, passados alguns segundos, levou mão à cueca e num rápido movimento ele colocou pra fora de novo. Suspirei. Ele já estava ficando mole. Falei pra ele “deixa ele duro de novo?” Ele fez um círculo com o polegar e o indicador e foi lentamente puxando pra cima e pra baixo. Eu devorava aquilo com os olhos e não ousava colocar as mãos. Ele ia fazendo bem devargarzinho, e a pelinha deixava a glande ora visível ora escondida. Ele foi continuando, e eu pedi “faz mais rápido”. Eu estava extremamente excitado e meu pau pedia pra ser libertado, ele queria respirar um ar e participar da ação, mas eu não poderia colocar pra fora sem assustá-lo. Decidi ficar apenas observando, até que ele percebeu o que ia acontecer e parou, de repente. Ele estava cor de rosa. Seus lábios meio abertos, eu sentia o calor emanando dele perto de mim e sentia um fraco cheiro de suor. Ele puxou a cueca de novo, mas percebi que o pau continuava a se mexer e pela forma com que ele se largou na carteira que ele havia gozado. Fiquei encarando a cueca dele pra ver se conseguia vê-la se molhar, mas ele percebeu e puxou a camiseta pra cobrir tudo. Isso foi como um sinal. Eu me levantei e disse “on page 35 we have two examples of...”
ATENÇÃO - este post possui conteúdo erótico. Antes de lê-lo, recomendo que leia o Introito
Provavelmente hoje seria mais um dia de aula como qualquer outro. Como de costume, ele chegaria atrasado e eu teria que lhe infringir algum castigo, de modo que ele aprendesse a chegar na hora. Isso já havia sido conversado entre a gente. Ele disse que tudo bem se eu quisesse inventar algum castigo porque ele faria e tudo bem. Mas como lidar com essa possibilidade de poder exercitar poder indistintamente, e a ainda manter o bom-senso de não dar vazão aos meus instintos?
De qualquer forma, eu deveria manter um certo distanciamento, exigindo alguma bobagem e fixando-me naquilo que realmente importava. O castigo era mais que uma punição para ele, era para mim uma chance de quebrar com as convenções e sofrer as conseqüências internas e externas disso: eu morria de medo de pedir algo que pudesse desestabilizá-lo, e mostrar que além de eu ter poder sobre ele, o que estava implícito na minha possibilidade de exigir o pagamento de um castigo, era o poder que ele exercia sobre mim.
Será que ele notava que era existente ou genuíno meu desejo? Pelas suas pernas, pelo seu torso, pela sua boca? Que eu sentia falta da sua imagem e do seu toque quente, quando eventualmente nossas peles se tocavam num reles aperto de mão? Sua juventude esbelta e despreocupada, sua sexualidade pungente e saltitante, seu medo daquilo que desconhecia, mas que era tão apelativo. Meu medo.
"Hi teacher! Sorry I am late". Quase vinte minutos de atraso. Eu olhei para ele de forma que seu rubor já mostrava que só pelo meu jeito de olhar, provavelmente eu aparentava estar bastante aborrecido. "What can I do? I have to give you a punishment for every five minutes, as we agreed."Mas por que hoje? Logo hoje que eu estava tão excitável, tão sensível na minha carência física e sentimental? Tão no cio, pra ser sincero. Todos aqueles pensamentos de momentos antes da sua chegada foram se mesclando com a visão dele ali tão perto, ao alcance dos braços e demorou alguns segundo para que eu conseguisse exteriorizar: "Take your shoes and socks off." Bom, de certa forma, conseguiria enganar meu desejo, ao poder ter acesso a algo que não podia ter em situações normais. Veria o pé dele e isso seria o bastante para deslocar o desejo para uma outra situação e, assim, poderia me enganar que havia sido satisfeito.
"That’s punishment number one." E ele rapidamente tirou as meias e os tênis. Havia mais três possibilidades de exigir certas coisas, porém não poderia pedir mais nenhum tipo de desnudamento, pois isso poderia conscientizá-lo do que eu queria de fato, e ainda não tinha elementos o suficiente para ter certeza que ele aceitaria jogar o meu jogo.
Pensando melhor eu até podia pedir sim um tipo de desnudamento que me fosse interessante ainda que não fosse um desnudamento em si. E tentei: "Put on your shirt inside out." Ele me olhou, como se não tivesse entendido o que eu havia pedido. Mostrei a parte de dentro da minha camiseta e fiz um sinal com a mão para que ele entendesse. Ele balançou a cabeça, fez um barulho com a língua, uma espécie de estralo e começou a tirar a camiseta. Eu teria apenas alguns segundos, entretanto pude mesmo observar atentamente aquele abdômen retinho, aquela pele branca e lisa. Até mesmo nas axilas ele parecia ter só alguns poucos pelos. Queria poder estender a mão e tocar naquela alvura, mas isso estava fora de cogitação. Ele terminou de ajeitar a blusa e sentou-se. Seria extremamente engraçado, para não dizer trágico se alguém entrasse naquele momento e visse aquilo: um menino com cabelo moicano, piercing, descalço, com a camiseta do avesso. Mas eu queria arriscar. Meu desejo crescia a cada segundo.
Não! Eu tinha que lutar contra ele. Tinha que perceber que aquela não era a hora nem o lugar. Que qualquer um podia entrar, apesar de que nas muitas aulas que eu já dera pra ele, ninguém tinha aparecido.
Tentei me sabotar. Gastando os castigos com bobagens, depois só teria que se ver só comigo na hora de castigar minha fraqueza, na hora de me arrepender.
“You are going to stand on the chair. Open your arms and then stretch them upwards. Ten seconds.”
A passividade silente e obediente me excitava de uma forma que eu nunca havia experimentado antes. Sentia o poder não em termos de força, mas em termos de permissão. Ele me permitia ir além do que eu ousaria, do que essa merda de sociedade aceitaria. Ele estava me deixando com raiva de que tudo não pudesse ser fácil assim. Mas, isso eram apenas migalhas.
Ele subiu na cadeira e esticou os braços em direção ao teto. Ao fazer isso, comecei a contar “One, Two...” Observava que a camiseta dele subia um pouco e deixava a mostra seu umbigo, e o caminho de pêlos clarinhos que subia desde o elástico de sua cueca. “Three... Four...” Sua calça, como dita a moda caindo, quase deixando a mostra toda aquela cueca azul. Não podia afirmar que estava olhando para um grande volume, mas vislumbrava as marcas dele ali. “Five... Six” Decido esticar a mão e tocar aquela carne, mas como não o assustar? Vou me restringir ao caminho de pêlos. “Seven... Eight...” Encosto de leve meu dedo no seu umbigo, movimento este que chama a atenção dele, que olha pra baixo e já meio desce os braços, como numa tentativa de se proteger. Ele não tinha se percebido tão vulnerável. Desci o dedo do umbigo, bem de leve, quase que não o tocando até o elástico da cueca, e sem tocá-la, tirei o dedo e recolhi o braço e me ouvi dizendo: “Nine... Ten”.
Ele desceu da cadeira e me olhava fixamente. Um olhar curioso, mas ao mesmo tempo, diferente daquele de quando ele havia subido.
“Last one, please” ele disse e abriu seu sorriso.
Então, seria só coisa da minha cabeça ou ele tinha de fato percebido o que eu queria? Era agora ou nunca. Deveria eu tentar uma abordagem direta ou uma forma velada de pedido?
“I want you to show me your dick. Hard.”
Ele pareceu não entender e me encarou por alguns segundos. Daí, ele apontou para a cueca e fez uma cara de surpresa. “Você quer ver...” e ficou calado. Respondi em inglês “Yes. Now.” A surpresa dele deu lugar ao que parecia ser aborrecimento. “Não.” Eu decidi partir pro ataque. “Nunca disse que a punição deveria ser fácil. Você tem medo ou vergonha de mostrar o que tem?”
Ele fechou a cara. Achei que ele fosse sair da sala, me expor. Ele baixou a cabeça e colocou a mão na cueca.
Percebi que ele, sem colocar pra fora, começava a lentamente apertar e manipular e acordar o que estava adormecido. Ele não olhava pra mim e parecia querer fazer aquilo o mais rápido possível, pra que pudesse se livrar da situação. The only way out is through, como diria a Alanis. Eu me dirigi até a porta e me encostei contra ela. Ele continuava focado em si e nos movimentos que estava fazendo. Via a mão dele subindo e descendo por dentro da sua calça e ele olhou pra mim. Não consegui ler este olhar rápido. “Tá ruim?” eu perguntei. Ele não respondeu. Com a outra mão livre, ele desceu a calça e a cueca, de uma forma a revelar seu pinto já ereto, maior do que eu supunha ser, mas não grande. Olhei para a porta. Não havia trava, mas queria poder ver de mais perto. Desencostei e fui me aproximando dele. Ao ver que eu me aproximava, ele voltou a puxar a cueca e eu disse “Eu não estava enxergando direito ali de longe. Prometo que não vou pôr a mão. Deixa só eu ver de perto, por favor”
Ele lançou um olhar meio suspeito para mim, depois para porta e, passados alguns segundos, levou mão à cueca e num rápido movimento ele colocou pra fora de novo. Suspirei. Ele já estava ficando mole. Falei pra ele “deixa ele duro de novo?” Ele fez um círculo com o polegar e o indicador e foi lentamente puxando pra cima e pra baixo. Eu devorava aquilo com os olhos e não ousava colocar as mãos. Ele ia fazendo bem devargarzinho, e a pelinha deixava a glande ora visível ora escondida. Ele foi continuando, e eu pedi “faz mais rápido”. Eu estava extremamente excitado e meu pau pedia pra ser libertado, ele queria respirar um ar e participar da ação, mas eu não poderia colocar pra fora sem assustá-lo. Decidi ficar apenas observando, até que ele percebeu o que ia acontecer e parou, de repente. Ele estava cor de rosa. Seus lábios meio abertos, eu sentia o calor emanando dele perto de mim e sentia um fraco cheiro de suor. Ele puxou a cueca de novo, mas percebi que o pau continuava a se mexer e pela forma com que ele se largou na carteira que ele havia gozado. Fiquei encarando a cueca dele pra ver se conseguia vê-la se molhar, mas ele percebeu e puxou a camiseta pra cobrir tudo. Isso foi como um sinal. Eu me levantei e disse “on page 35 we have two examples of...”
Introito ao que está por vir, ou prelúdio às Renúncias
Segundo alguns, a arte tem uma função. Essa função, em linhas bem gerais, num resumo bem tosco, é que ela seria um ato social simbólico. Ou seja, ela serve a um propósito de “resolver” certas questões de uma forma que não seria possível na realidade. Assim, um dia eu me deparei com um problema e não conseguia imaginar um outro modo de solucionar o dilema senão através da arte. Decidi, então, escrever a série Renúncias. Cada conto deveria ser uma forma de materializar meu desejo, dar vazão a ele e, assim, transcendê-lo.
Com o passar do tempo, mesmo não tendo terminado os contos, minha vida foi mudando e as perguntas mudaram, o modo de respondê-las também, mas ainda assim, queria dar vazão às idéias que tinham se formado de maneira tão nítida na minha mente.
Nada do que escrevo aconteceu de verdade. Nem poderia. Mera criação de uma mente insatisfeita com o mundo... Escravo de seus desejos, mas com tanta liberdade quanto um escravo para exercer sua vontade, dependente da ética libidinal alheia, hegemônica. Ou apenas um egoísta despeitado. Escolha a definição que melhor lhe aprouver.
Estes textos, mais do que quaisquer outros revelam o que existe de mais torpe em mim. Mexo com tabus, com uma linguagem “estranha”, até este momento, já que ela pra mim tem mais a ver com uma práxis do que com uma teoria. Sou explícito. Oscar Wildeanamente explícito (sem pretensões de ser igualmente talentoso). Estas são as verdadeiras notas do cárcere que sou eu.
A cada conto, fui tentando mudar, brincar com o estilo, com a expectativa de um possível leitor, e com as minhas próprias.
Cada conto terá o nome daquele a quem se refere ou uma brincadeira com esse nome: um anagrama, um trocadilho.
Com o passar do tempo, mesmo não tendo terminado os contos, minha vida foi mudando e as perguntas mudaram, o modo de respondê-las também, mas ainda assim, queria dar vazão às idéias que tinham se formado de maneira tão nítida na minha mente.
Nada do que escrevo aconteceu de verdade. Nem poderia. Mera criação de uma mente insatisfeita com o mundo... Escravo de seus desejos, mas com tanta liberdade quanto um escravo para exercer sua vontade, dependente da ética libidinal alheia, hegemônica. Ou apenas um egoísta despeitado. Escolha a definição que melhor lhe aprouver.
Estes textos, mais do que quaisquer outros revelam o que existe de mais torpe em mim. Mexo com tabus, com uma linguagem “estranha”, até este momento, já que ela pra mim tem mais a ver com uma práxis do que com uma teoria. Sou explícito. Oscar Wildeanamente explícito (sem pretensões de ser igualmente talentoso). Estas são as verdadeiras notas do cárcere que sou eu.
A cada conto, fui tentando mudar, brincar com o estilo, com a expectativa de um possível leitor, e com as minhas próprias.
Cada conto terá o nome daquele a quem se refere ou uma brincadeira com esse nome: um anagrama, um trocadilho.
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